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SOBREVIVENTE
Estudante se salvou porque pulou do quinto andar do prédio em chamas na universidade
Neve amortece queda e salva brasileiro
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Fernando Ivan Santos Ostrowski, 18, dividia um quarto
com três outros estudantes no
quinto andar do "Quarentena",
nome do edifício residencial -e
também do período de adaptação a Moscou- reservado aos
estrangeiros recém-chegados
para estudar na Universidade da
Amizade entre os Povos, ex-Patrice Lumumba.
Poderia ter morrido, como
morreram 36 colegas seus no incêndio da madrugada de ontem.
Mas a primeira nevasca pesada
do outono caiu naquela região
da Rússia entre sábado e domingo. Fernando pulou do quinto
andar. Machucou-se pouco. Sua
queda foi amortecida pela neve.
Era início da madrugada em
Moscou. Fernando foi o último
de seu quarto a acordar com o
som incessante da sirene e os
berros de "Fogo, fogo!".
Um de seus colegas tentou sair
pela porta. Mas, ao abri-la, recebeu no rosto a lambida de uma
fumaça espessa. Recuou. Estava
escuro. "Vamos todos morrer",
disse um deles. O estudante brasileiro respondeu: "Fiquem
quietos, vamos tentar pular".
Internado no Hospital 64 da
capital russa com ferimentos leves -fratura em duas costelas e
uma suspeita de fratura no antebraço, na altura do punho-
Fernando está entre os sobreviventes do incêndio. Estará completamente restabelecido em
três semanas.
Ele conversou, por meio do celular de um amigo, com o pai, o
advogado Fernando Ostrowski,
que mora em Brasília. Também
conversou com um diplomata
brasileiro que o visitou no hospital, o chefe do setor consular da
Embaixada do Brasil em Moscou, Acir Pimenta Madeira.
Disse ao pai acreditar que tenha ocorrido um milagre. A família é bastante religiosa, adventista. Disse também que isso o
fazia feliz, mas que estava ao
mesmo tempo entristecido porque entre os mortos há conhecidos seus.
A janela do quarto que ele e
três outros estudantes ocupavam no alojamento tinha vidraça dupla por causa do frio. A janela foi aberta. Fernando teve a
presença de espírito de apanhar
uma pasta com todos os seus documentos. Atirou-a para bem
longe, no escuro, na direção do
jardim.
Olhou para baixo. Labaredas
saíam do segundo e do terceiro
andares. Sofreria ao menos queimadura grave se pulasse rente às
janelas. Precisou tomar impulso
ao pular. Pensou em se agarrar
aos últimos galhos de uma árvore há semanas desfolhada. Não
os alcançou, contou ao diplomata brasileiro que o visitou no
hospital.
Vestindo apenas o pijama,
caiu sobre a neve e perdeu os
sentidos. Acordou já hospitalizado. Outros brasileiros vieram
ao seu encontro. Trouxeram
roupas, chocolates. Entre os estudantes, Fábio Lopes de Oliveira, residente de medicina na
mesma universidade.
Fernando está em Moscou há
apenas três semanas. Durante o
período de "quarentena", precisaria acelerar o aprendizado do
idioma russo. Ele o estudara por
um ano e meio em Brasília. Mas
não o suficiente para começar o
curso de direito internacional.
A idéia de ir para a Rússia, conta sua mãe, Margarete, fermenta
um pouco na família. O avô paterno era russo. Emigrou para o
Rio Grande do Sul, onde o pai
nasceu. O pai se mudou para
Brasília. Casou-se com uma
goiana.
Fernando tem uma irmã mais
velha, que estuda medicina na
Argentina. Aos 16 anos, ele já
pensava em estudar em Moscou.
Terminou o colegial no ano passado, já com um pedido de bolsa. O pedido foi aceito. Fernando
se despediu dos pais e embarcou.
Deixou em Brasília o violino.
Estuda o instrumento desde pequeno. Sua mãe comentou ontem ter sido providencial que ele
não o tenha levado. A exemplo
do que aconteceu com as roupas, com os livros e com os objetos pessoais, o violino teria sido
calcinado durante o incêndio.
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