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Justiça da Argentina descrimina porte de drogas para consumo
Decisão corrobora projeto que governo pretende enviar ao Congresso, no qual usuário não é considerado criminoso
Juízes ressaltam que Estado não deve se envolver em decisões individuais; mães de dependentes, igreja e vários setores protestam
SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES
A Suprema Corte de Justiça
da Argentina decidiu ontem,
por unanimidade, que o porte
de drogas para consumo não é
crime. A sentença se refere à
causa iniciada na cidade de Rosário (a 306 km de Buenos Aires) envolvendo cinco rapazes
detidos quando caminhavam
pela rua levando nos bolsos cigarros de maconha.
Com a decisão, a Suprema
Corte indica às instâncias inferiores da Justiça sua interpretação favorável à descriminação do usuário de drogas e corrobora projeto de lei nesse sentido que o governo pretende
enviar ao Congresso.
Antes do voto, os juízes chegaram a acordo sobre a causa-modelo para a abertura do precedente. O objetivo era deixar
claro que a corte julga inconstitucional a tipificação como crime do consumo feito em ambiente privado e sem oferecer
riscos a terceiros. Ou seja, os
juízes ressaltam que não cabe
interferência do Estado em decisões de foro íntimo.
Foram descartados pela corte os processos que envolviam
menores de idade, substâncias
mais nocivas do que a maconha
ou quantidades maiores da droga, consumo em local público,
indícios de vício ou suspeita de
ligação com o tráfico.
Estima-se que haja cerca de
26 mil causas em andamento
na Justiça argentina por infrações à lei de entorpecentes. Em
torno de 70% desse total seriam relacionados ao consumo
e não ao tráfico de drogas.
A corte escorou a decisão de
ontem no argumento de que "é
desumano penalizar o indivíduo [usuário de drogas], submetendo-o a um processo criminal que o estigmatizará por
toda a vida", mas ressaltou o caráter criminoso do tráfico e a
necessidade de combatê-lo.
No Brasil ainda é crime portar drogas para consumo, mas
desde 2006 existe maior tolerância, e o usuário não vai preso. A lei brasileira prevê como
penas advertência sobre os
efeitos das drogas, prestação de
serviços comunitários e medidas educativas.
Reações
"A política repressiva que se
destinava a castigar o usuário
como se fosse um narcotraficante está chegando ao fim, por
razões óbvias: não reduziu um
único hectare de cultivo em nenhum lugar do mundo, nem reduziu uma única rede de comercialização e tráfico", declarou Aníbal Fernández, chefe de
gabinete da presidente argentina, Cristina Kirchner.
Já as reações contrárias à decisão exibiam uma preocupação em comum -a de que a descriminação do usuário se converta num incentivo ao consumo de drogas.
Mães de dependentes químicos protestaram, exibindo faixas em frente à Suprema Corte.
A Igreja Católica considerou a
decisão prejudicial, bem como
a Prefeitura de Buenos Aires.
De acordo com o instituto
privado de pesquisa Ibarômetro, 53,7% dos argentinos são
contra a descriminação do consumo de drogas.
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