São Paulo, sexta-feira, 26 de outubro de 2007

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Iraque pede contenção à Turquia

Tensões aumentam na fronteira, onde Exército turco diz ter matado mais 30 guerrilheiros do PKK

Ancara pede ajuda aos EUA para conter separatistas curdos e põe Washington diante de dilema; turcos se dividem quanto a problema

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A DIYARBAKIR (TURQUIA)

Enquanto a Turquia continuava a efetuar ataques a bases do grupo guerrilheiro PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) no norte do Iraque e mantinha a ameaça de invadir o país vizinho, o governo iraquiano propôs ontem uma solução política para evitar a ampliação do conflito.
Pressionado por uma opinião pública cada vez mais revoltada com os ataques do PKK, que deixaram dezenas de soldados mortos nas últimas semanas, Ancara, porém, deu mostras de que sua paciência está no fim e apelou aos EUA para que ajudem seu Exército a eliminar a guerrilha curda da fronteira.
Na véspera da chegada de uma delegação do governo iraquiano à Turquia, no que pode ser uma das últimas chances da diplomacia para impedir que a Guerra do Iraque ganhe uma nova e perigosa dimensão regional, o chanceler Hoshyar Zebari antecipou o que Bagdá oferecerá hoje, quando terão início as conversações.
O governo iraquiano, segundo Zebari, ele próprio um influente político curdo, promete "pacificar, isolar e desmantelar" as ações dos separatistas curdos no norte do Iraque. Entretanto o governo turco, que nos últimos dias concentrou tropas na fronteira e relatou operações aéreas e terrestres contra os rebeldes curdos em território iraquiano, tem indicado que não aceitará ações meramente políticas.

Ataques
Ontem as TVs turcas deram ampla cobertura a relatos pelo Exército de ataques a bases do PKK no norte do Iraque. Os confrontos teriam deixado pelo menos "30 terroristas mortos". As imagens da ação militar foram ao ar graças a uma decisão judicial que derrubou restrições impostas pelo governo a notícias do conflito dias antes.
Sob censura, emissoras como a SKYTurk transmitiam seus noticiários nos últimos dias apenas com reportagens leves, enquanto uma tarja no pé do vídeo informava da proibição.
A delegação iraquiana, chefiada pelo ministro da Defesa, Abdul-Qader Muhammad Jasim, chegou ontem a Ancara para tentar uma solução para a crise, mas advertiu que ações militares contra o PKK, como exige o governo turco, não estarão em pauta nas conversas que serão realizadas hoje.
Zebari afirmou que a proposta iraquiana é fechar os escritórios políticos do PKK no Curdistão iraquiano, uma região semi-autônoma rica em petróleo, e interromper o suprimento de armas aos separatistas.
O próprio Zebari admitiu que a proposta é bem menos do que a Turquia vem pedindo. "As expectativas turcas podem ser altas, mas também precisam ser razoáveis", disse.
Em meio às baixas expectativas em torno do encontro, o premiê turco, Recep Tayyip Erdogan, aumentou a pressão sobre os EUA, lembrando que os americanos, por muito menos, haviam invadido o Iraque. "Nos perguntamos por que os EUA vieram de tão longe para invadir o Iraque", disse Erdogan, líder de um país que tem o segundo maior Exército da Otan (aliança militar do Ocidente), atrás apenas do americano.
Em visita à Romênia, Erdogan não escondeu o momento de tensão das relações com os EUA. "Nós temos um problema [na fronteira]. Que tipo de problema os EUA tinham com o Iraque? Neste momento, os EUA, como nosso aliado estratégico, estão na posição de atuar conosco. Nós agimos junto com eles no Afeganistão."
As queixas da Turquia têm colocado o governo americano em uma posição delicada. Por um lado, precisa manter o apoio ao governo central do Iraque, do qual depende para que sua estratégia de segurança funcione. Por outro, não pode negar ajuda a um aliado da Otan, sobretudo diante de argumentos que sempre usou, como o direito à defesa de um governo ante ataques terroristas.
Apesar de demonstrar compreensão com o problema turco, Washington já indicou que não vai atuar militarmente contra o PKK, que opera nas montanhas de Kandil, uma das regiões de mais difícil acesso do Oriente Médio.
O aumento das tensões na fronteira têm exposto as divisões dos turcos em relação ao problema. Enquanto nas cidades mais ricas, como Ancara e Istambul, prosseguem os protestos diários contra o PKK, exigindo uma ação mais dura do governo, no sudeste, onde predomina a população de origem curda, o clima é de expectativa, mas não de temor.
"Vivemos essa crise há anos, não acredito que haverá uma guerra desta vez", disse Aziz, um alfaiate de 37 anos. Como a maioria dos curdos de Diyabarkir, ele reluta em falar de política. "O que mais nos preocupa ainda é a pobreza em que vive a maioria dos curdos."


Com agências internacionais


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