São Paulo, sexta-feira, 27 de janeiro de 2006

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CHOQUE NO ORIENTE MÉDIO

Presidente americano evita chamar Hamas de grupo terrorista e diz ver sua vitória como "atributo saudável" da democracia

Bush recusa diálogo, mas adota cautela

Pedro Ugarte/France Presse
Em Ramallah (Cisjordânia), palestinas militantes do Hamas celebram a vitória do grupo extremista islâmico nas eleições legislativas


LEILA SUWANN
DE NOVA YORK

O presidente dos EUA, George W. Bush, disse ontem que a vitória do Hamas nas eleições parlamentares palestinas é um alerta para a velha-guarda palestina -lideranças do Fatah ligadas à geração de Iasser Arafat, o líder morto em 2004- e avisou que não haverá diálogo com o novo governo se for mantida a plataforma de destruição de Israel.
O Hamas é considerado um grupo terrorista pelo governo norte-americano, mas Bush foi cauteloso e se referiu ao "braço armado" do movimento -sem citar o termo "terrorismo".
"Eu deixei bastante claro que os Estados Unidos não apóiam partidos políticos que pregam a destruição de nosso aliado, Israel, e que as pessoas precisam renunciar a essa parte de sua plataforma", disse Bush, em entrevista coletiva em Washington.
O presidente tampouco respondeu diretamente sobre a possibilidade de corte no auxílio financeiro norte-americano para a Autoridade Nacional Palestina -disse que os EUA aguardam a formação do novo governo e esperam que o presidente Mahmoud Abbas, do derrotado Fatah, permaneça no cargo. Abbas já disse que renunciará se não puder continuar a negociar a paz com os israelenses.
O gabinete palestino apresentou renúncia coletiva e, por enquanto, o Fatah se recusa a formar coalizão com o Hamas e dá sinais de que irá se organizar na oposição.
Bush evitou interpretar a vitória do Hamas nas urnas como uma guinada da população palestina ao extremismo islâmico. Os Estados Unidos têm pregado a democratização no Oriente Médio, e o presidente preferiu atribuir a vitória do Hamas exclusivamente à insatisfação com a corrupção e a incompetência administrativa da Autoridade Nacional Palestina.
"A paz nunca está morta, porque as pessoas querem a paz", disse, classificando a vitória dos extremistas como um "aviso de despertar", atributo "positivo" e "saudável" da democracia.
Uma interpretação da fala de Bush é a de que foi um aceno para o Hamas renunciar à violência e reconhecer o Estado de Israel -conforme os primórdios do diálogo com a OLP (Organização para a Libertação da Palestina), antes considerado um grupo terrorista.
Bush disse não estar surpreso com o resultado: "Se há corrupção, eu não estou surpreso que o povo tenha dito "vamos nos livrar da corrupção". Se o governo não era reativo, eu não estou nem um pouco surpreso que o povo tenha dito "queremos um governo que reaja'". Para ele, as eleições de anteontem demonstram que "a liberdade começa a se espalhar pelo Oriente Médio".
A fala de Bush pode ser considerada amena para não dificultar as negociações políticas dentro da Autoridade Nacional Palestina nem condenar de antemão qualquer esforço na retomada do processo de paz.
Alguns analistas consideram que as pressões contra a participação do Hamas nas eleições ajudaram a polarizar o eleitorado. O Hamas é responsável por atentados terroristas contra civis em Israel, que recusa diálogo com o grupo, e conquistou algumas prefeituras nas últimas eleições palestinas.
O presidente norte-americano disse preferir não "especular" sobre a formação do novo governo, mas já acionou seus canais diplomáticos.
A secretária de Estado, Condoleezza Rice, conversou ontem com Abbas, e o presidente palestino deve se encontrar com dirigentes do Quarteto (EUA, ONU, União Européia e Rússia), que tem mediado a aproximação entre Autoridade Nacional Palestina e Israel, na próxima segunda-feira em Londres. Rice também se manifestou sobre a vitória do Hamas. Em Davos (Suíça), disse que "não é possível ter um pé na política e outro no terrorismo".

Com agências internacionais

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