São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 2006

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RELIGIÃO

Muçulmano convertido ao cristianismo que poderia ser condenado à morte deverá ser declarado mentalmente incapaz

Afeganistão prepara soltura de apóstata

22.mar.2006/Reuters
O afegão Abdur Rahman segura uma Bíblia em tribunal que o julga por apostasia, em Cabul



DA REDAÇÃO

O juiz encarregado de julgar um afegão que poderia ser condenado à morte por ter se convertido ao cristianismo considerou que havia problemas técnicos no processo e devolveu o caso ontem para a Promotoria. É a senha para que Abdur Rahman, cuja libertação está sendo exigida pelos países ocidentais que sustentam o governo afegão, seja solto.
A fim de tentar contornar a ira de clérigos conservadores que exigem a punição de Rahman, ele poderá ser declarado louco. A família diz que ele ouve vozes. Um funcionário do governo afegão com grande familiaridade com o caso afirmou à agência de notícias Associated Press que Rahman, 41, poderá ser solto ainda hoje.
Embora o cristianismo não seja proibido no Afeganistão, a apostasia, o abandono da fé islâmica, é punido com a morte segundo a sharia, a lei islâmica parcialmente aplicada no país.
Um promotor disse que o estado mental de Rahman vai ser examinado. Vários de seus parentes afirmaram que ele está com problemas mentais. "É função da Promotoria decidir se ele está mentalmente apto a enfrentar um julgamento", disse o porta-voz da Suprema Corte do Afeganistão, Abdul Wakil Omeri.

Entrevista
Em entrevista publicada ontem por um jornal italiano, Rahman disse que tomou a decisão de converter-se com plena consciência. "Se eu tiver de morrer, morrerei", disse o réu ao "La Repubblica", que não o entrevistou diretamente, mas conseguiu mandar as perguntas e receber as respostas por meio de um representante de instituição de direitos humanos que o visitou na prisão.
Rahman disse que decidiu tornar-se cristão em "pequenos passos", depois de deixar o Afeganistão nos anos 90. Ele mudou-se para Peshawar, no Paquistão, e daí para a Alemanha.
"Em Peshawar, trabalhei para uma organização humanitária. Eles eram católicos. Comecei a conversar com eles sobre religião, li a Bíblia e abri meu coração", afirmou. Rahman também disse ao "La Repubblica" que sua família -incluindo a ex-mulher e duas filhas adolescentes- denunciou-o às autoridades.

Dificuldade
O caso coloca o presidente afegão, Hamid Karzai, numa posição difícil. Enquanto países como os EUA e o Reino Unido exigem que o julgamento seja suspenso em nome da liberdade religiosa, clérigos conservadores, que detêm bastante poder no país, querem a aplicação da sharia. Religiosos ameaçaram incitar a população a matar Rahman se ele for solto. Disseram que haverá problemas se o julgamento for suspenso.
"Haverá muitos protestos", disse Faiez Mohammed, clérigo sunita na cidade de Kunduz.
Rahman foi transferido para a prisão de segurança máxima Policharki, depois que presos de um outro centro de detenção em Cabul o ameaçaram.
Policharki é uma prisão de alta segurança que abriga cerca de 2.000 presos, incluindo uns 350 militantes do Taleban e da rede Al Qaeda. Eles são acusados de incitar um motim no mês passado que deixou seis mortos.
"Nós o vigiamos constantemente. Esse é um caso muito delicado, então ele precisa de muita segurança", disse o diretor da prisão, general Shahmir Amirpur.
Rahman está sozinho numa cela próxima da guarda, disse o diretor. Afirmou também que ele pediu uma Bíblia aos guardas, mas ninguém tinha uma para lhe dar.

Com agências internacionais


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