São Paulo, domingo, 27 de maio de 2007

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Batalha verbal marca eleição espanhola

Premiê socialista afirma que é "azar" país ter direita "retrógrada"; oposição culpa governo por clima de "guerra civil"

Às vésperas dos pleitos municipais em país que já foi modelo de consenso, oposição e governo se atacam com aspereza


RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL

As eleições municipais de hoje na Espanha são tratadas pelos principais partidos como uma batalha do fim do mundo. "Votar nos socialistas é fortalecer o ETA" , atacou o líder da oposição, o conservador Mariano Rajoy. "Que azar da Espanha ter uma direita tão retrógrada", retrucou o primeiro-ministro, José Luis Rodríguez Zapatero. "Votar pela esquerda é votar pela convivência."
Nos últimos três anos, o grau de gritaria e absoluta falta de consenso em qualquer assunto domina a vida política espanhola. Tanto que, segundo pesquisa recente, a "crispação política" tornou-se um dos principais problemas do país, junto com o terrorismo, desemprego, imigração ilegal e drogas.
Tal irritação contrasta com a transição democrática espanhola. Após o fim da ditadura, em 1975, sob a autoridade do rei Juan Carlos 1º, de herdeiros do franquismo a comunistas chegaram a diversos consensos, os Pactos de Moncloa, e deixaram para trás a violência da Guerra Civil (1936-1939) e da ditadura franquista (1939-1975). Até uma tentativa de golpe foi debelada sem tiros.
Nas últimas décadas, a esquerda aceitou e promoveu a abertura econômica e as privatizações, enquanto a direita nem ousou reduzir o sistema de bem-estar social aperfeiçoado sob os socialistas. Hoje, apesar de não se discutir mais a economia nem os gastos sociais do país, a convivência desandou.

"Clima de guerra civil"
Discute-se por tudo e com ataques pesados de lado a lado. O ex-premiê direitista José María Aznar acusou Zapatero de estar levando o país a "um clima de guerra civil, que tivemos há 70 anos".
Na polarização da política espanhola, os dois lados não deixam de provocar mais crispação. "Zapatero busca a lembrança sectária da Guerra Civil, já quebrou o consenso constitucional ao pactuar com nacionalistas e radicais e rompeu o acordo antiterrorista ao negociar com o ETA", disse à Folha o porta-voz do oposicionista Partido Popular no Congresso, deputado Miguel Ángel Cortés.
"A transição teve sucesso porque os espanhóis decidiram olhar para a frente, superar enfrentamentos, baseando a convivência em acordos entre os dois grandes partidos nacionais. Zapatero quer romper esse consenso que seus antecessores, Felipe González e José María Aznar, mantiveram."
O terrorismo é um dos temas das eleições, em que as questões municipais ficaram em segundo plano. Zapatero passou boa parte de 2006 prometendo o início do fim do ETA, que declarou cessar-fogo em março do ano passado. O governo começou a negociar com o ETA, atitude criticada pelos conservadores, que defende o combate aos terroristas.
Não deu certo. Um atentado no aeroporto madrilenho de Barajas em dezembro matou dois equatorianos e jogou pelos ares a trégua. Para a oposição, o governo foi ingênuo e desinformado no trato com os terroristas. Em janeiro, a popularidade de Zapatero caiu a 40%, a menor em três anos de governo.
"Zapatero é um provocador, abriu várias frentes de batalha em um só mandato, e acredita que está fazendo o bem", diz a socióloga Josefina Elías, diretora do instituto de pesquisas Opina, de Madri.
Eleitora de Zapatero, ela acusa os conservadores pelo confronto constante. "Eles nunca assimilaram a derrota em 2004, por terem manipulado informação após os atentados em Madri", acusa.
Quanto às eleições, Madri e Valência devem continuar nas mãos dos conservadores, e Barcelona e Sevilha com a esquerda. Pouco deve mudar em meio ao bate-boca.


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