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Batalha verbal marca eleição espanhola
Premiê socialista afirma que é "azar" país ter direita "retrógrada"; oposição culpa governo por clima de "guerra civil"
Às vésperas dos pleitos municipais em país que já foi modelo de consenso, oposição e governo se atacam com aspereza
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
As eleições municipais de hoje na Espanha são tratadas pelos principais partidos como
uma batalha do fim do mundo.
"Votar nos socialistas é fortalecer o ETA" , atacou o líder da
oposição, o conservador Mariano Rajoy. "Que azar da Espanha ter uma direita tão retrógrada", retrucou o primeiro-ministro, José Luis Rodríguez
Zapatero. "Votar pela esquerda
é votar pela convivência."
Nos últimos três anos, o grau
de gritaria e absoluta falta de
consenso em qualquer assunto
domina a vida política espanhola. Tanto que, segundo pesquisa recente, a "crispação política" tornou-se um dos principais problemas do país, junto
com o terrorismo, desemprego,
imigração ilegal e drogas.
Tal irritação contrasta com a
transição democrática espanhola. Após o fim da ditadura,
em 1975, sob a autoridade do
rei Juan Carlos 1º, de herdeiros
do franquismo a comunistas
chegaram a diversos consensos, os Pactos de Moncloa, e
deixaram para trás a violência
da Guerra Civil (1936-1939) e
da ditadura franquista (1939-1975). Até uma tentativa de golpe foi debelada sem tiros.
Nas últimas décadas, a esquerda aceitou e promoveu a
abertura econômica e as privatizações, enquanto a direita
nem ousou reduzir o sistema de
bem-estar social aperfeiçoado
sob os socialistas. Hoje, apesar
de não se discutir mais a economia nem os gastos sociais do
país, a convivência desandou.
"Clima de guerra civil"
Discute-se por tudo e com
ataques pesados de lado a lado.
O ex-premiê direitista José
María Aznar acusou Zapatero
de estar levando o país a "um
clima de guerra civil, que tivemos há 70 anos".
Na polarização da política espanhola, os dois lados não deixam de provocar mais crispação. "Zapatero busca a lembrança sectária da Guerra Civil,
já quebrou o consenso constitucional ao pactuar com nacionalistas e radicais e rompeu o
acordo antiterrorista ao negociar com o ETA", disse à Folha
o porta-voz do oposicionista
Partido Popular no Congresso,
deputado Miguel Ángel Cortés.
"A transição teve sucesso
porque os espanhóis decidiram
olhar para a frente, superar enfrentamentos, baseando a convivência em acordos entre os
dois grandes partidos nacionais. Zapatero quer romper esse consenso que seus antecessores, Felipe González e José
María Aznar, mantiveram."
O terrorismo é um dos temas
das eleições, em que as questões municipais ficaram em segundo plano. Zapatero passou
boa parte de 2006 prometendo
o início do fim do ETA, que declarou cessar-fogo em março
do ano passado. O governo começou a negociar com o ETA,
atitude criticada pelos conservadores, que defende o combate aos terroristas.
Não deu certo. Um atentado
no aeroporto madrilenho de
Barajas em dezembro matou
dois equatorianos e jogou pelos
ares a trégua. Para a oposição, o
governo foi ingênuo e desinformado no trato com os terroristas. Em janeiro, a popularidade
de Zapatero caiu a 40%, a menor em três anos de governo.
"Zapatero é um provocador,
abriu várias frentes de batalha
em um só mandato, e acredita
que está fazendo o bem", diz a
socióloga Josefina Elías, diretora do instituto de pesquisas
Opina, de Madri.
Eleitora de Zapatero, ela
acusa os conservadores pelo
confronto constante. "Eles
nunca assimilaram a derrota
em 2004, por terem manipulado informação após os atentados em Madri", acusa.
Quanto às eleições, Madri e
Valência devem continuar nas
mãos dos conservadores, e Barcelona e Sevilha com a esquerda. Pouco deve mudar em meio
ao bate-boca.
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