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Ex-opositor de Chávez se beneficia com fim da RCTV
TV de magnata que articulou golpe ficará com publicidade da emissora que fecha hoje
Cisneros, hoje aliado de Chávez, herdará mercado de US$ 163 milhões; protesto em Caracas reúne milhares contra a cassação do canal
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
O fim do canal oposicionista
RCTV, previsto para as 23h59
de hoje (0h59 de amanhã em
Brasília), deixará sua milionária fatia publicitária para o único concorrente em nível nacional, a Venevisión. A emissora
pertence a Gustavo Cisneros, o
magnata que, de articulador do
golpe frustrado contra Hugo
Chávez, em abril de 2002,
transformou-se em aliado tácito do presidente venezuelano.
Ontem, a Venevisión praticamente ignorou os manifestantes que tomaram as ruas do
centro de Caracas. Diante da
RCTV, milhares protestaram
contra o fim da concessão, medida rechaçada por 69% da população, segundo pesquisa do
instituto Datanálisis.
Chamados no passado de "os
quatro cavaleiros do Apocalipse" por Chávez, os canais privados Venevisión, RCTV, Televén
e Globovisión tiveram uma
atuação bastante coordenada
entre 2002 e 2004, período que
inclui o golpe de Estado, a greve
petroleira e o referendo para tirar o mandato de Chávez.
Durante essa época, Cisneros, 61, era um dos principais
porta-vozes da oposição venezuelana, cujo espaço havia sido
tomado pelos meios de comunicação no vazio deixado pela
decadência dos partidos tradicionais. No golpe, reuniu-se
com o empresário Pedro Carmona, que assumiu o país durante o afastamento de Chávez.
"O verdadeiro canal golpista
foi o canal 4. Gustavo Cisneros
era o chefe da conspiração de
abril de 2002. Era no seu canal
que se reuniam os conspiradores; foi o eixo midiático da campanha contra o governo", disse
à Folha Teodoro Petkoff, diretor do jornal oposicionista "Tal
Cual" (leia sua entrevista no
caderno Mais!), mas que não
apoiou o golpe que afastou
Chávez do poder por dois dias.
Anteontem, a Conatel (Comissão Nacional de Telecomunicações) renovou a concessão
da Venevisión até 2012, um ano
antes da próxima campanha
presidencial, da qual Chávez
pretende participar mudando a
Constituição para incluir a reeleição indefinida.
Transformação
A ação de Cisneros começou
a mudar na época do referendo,
quando se reuniu com Chávez,
em encontro viabilizado pelo
ex-presidente dos EUA Jimmy
Carter. Para observadores da
polarizada mídia local, a conversa foi um divisor de águas.
O giro de 180º da Venevisión
-e da Televén, de menor alcance- ficou claro na campanha
presidencial do ano passado,
quando Chávez foi reeleito. Segundo um relatório da União
Européia sobre o pleito, a TV de
Cisneros "dedicou 84% do tempo de informação política à posição oficial e apenas 16% à coalizão [oposicionista] Unidade".
"O tom da Televén e da Venevisión foi pouco crítico em geral com as coalizões, mas, do
ponto de vista quantitativo, as
duas favoreceram abertamente
a posição governista", diz o informe da UE.
Já sobre a RCTV, o relatório
mostra a tendência inversa: a
oposição recebeu 69% do tempo, em tom geralmente positivo, enquanto o governo teve
29%, na maior parte das vezes
em tom negativo.
A tendência da Venevisión de
favorecer o governo persistiu
na cobertura sobre o fim da
concessão à RCTV, anunciada
em dezembro. "Eles se cuidaram muitíssimo para não entrar em conflito com a decisão
governamental", disse à Folha
Marcelino Bisbal, diretor da
pós-graduação em comunicação social da Universidade Católica Andrés Bello.
"Os golpistas de verdade estão impunes, porque simplesmente se colocaram ao lado do
governo. Como disse o ministro das Comunicações, Willian
Lara, "o canal 4 já baixou do
golpismo, portanto não vamos
tomar medidas contrárias'",
afirma Petkoff.
Analistas prevêem que o canal de Cisneros herdará a
maior parte da fatia publicitária da RCTV, estimada para este ano em US$ 163 milhões, segundo a revista especializada
"Producto". "No campo publicitário, o fim da RCTV beneficia o outro canal nacional. A
publicidade requer maior audiência e sintonia possível, e
quem oferece isso é a Venevisión", disse Bisbal.
Por e-mail, a Folha pediu entrevista com Cisneros por meio
do presidente da Venevisión,
Carlos Bardasano, que confirmou o recebimento da mensagem, mas não deu resposta.
De acordo com a lista da
"Forbes", Cisneros é o 119º homem mais rico do mundo, terceiro da América Latina, com
uma fortuna de US$ 6 bilhões.
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