São Paulo, domingo, 27 de maio de 2007

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Discurso ecológico domina retórica dos americanos

População dos EUA, porém, não consegue fazer a ponte entre o falar e o agir

Segundo pesquisadores, sociedade não está disposta a abrir mão de hábitos e conforto para preservar o ambiente, mas sabe cobrar


DENYSE GODOY
DE NOVA YORK

Está em toda parte. É o assunto de debates na televisão diariamente. Tema de documentários, livros, shows musicais e até gincanas que as escolas promovem para as crianças e suas famílias. Aparece em qualquer tipo de site na internet. E vira apelo nos guardanapos dos restaurantes, em placas nas lojas e em outros estabelecimentos comerciais: conserve, recicle, não desperdice.
Muito bem, os americanos perceberam que são sérios os problemas do aquecimento global, da escassez de água e da poluição. Entretanto do discurso à ação o caminho é bem longo. "As pessoas nos EUA acreditam que a situação pode ficar grave e querem que alguém faça alguma coisa -mas, de preferência, alguém que não elas mesmas", diz Anthony Leiserowitz, diretor do Projeto Sobre Mudança Climática da Escola de Estudos Florestais e Ambientais da Universidade Yale.
Leiserowitz é estudioso de riscos ecológicos, políticas públicas e comportamento e já fez grandes pesquisas a respeito de desenvolvimento sustentável também no Reino Unido, no México, na Argentina e no Brasil. Quanto aos americanos, concluiu, eles apóiam tratados internacionais como o Protocolo de Kyoto, a idéia de fabricar veículos menos poluentes e a regulação da emissão de gases de efeito estufa. "Porém, ao perguntarmos às pessoas se concordam em pagar mais por combustíveis ou energia elétrica -uma forma de limitar o consumo desses itens-, observamos forte resistência", conta.
"Elas não estão preparadas para pagar o preço", acrescenta Howard Herzog, engenheiro do Laboratório para Energia e Ambiente do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).
Quando olham para os lados buscando identificar quem possa tomar uma atitude concreta em defesa do planeta para que eles mesmos não precisem abrir mão de seus hábitos e padrão de vida, os americanos freqüentemente colocam no centro do alvo as empresas. Segundo pesquisa realizada pela consultoria Cone, 93% deles acreditam que as companhias são responsáveis pela preservação do ambiente, principalmente reduzindo a poluição que emitem e fabricando produtos e usando embalagens ecológicas.
Sem saída, visto que 85% dos consumidores pensariam em trocar de marca por causa de práticas ambientalmente negativas por parte de uma empresa, as companhias têm cedido e lutam para corresponder às expectativas. Por exemplo, a IBM desenvolveu um novo tipo de semicondutor que requer menos eletricidade; a Starbucks convidou designers famosos para decorar seu guarda-sol símbolo e leiloará as peças, revertendo a renda para uma ONG ambientalista; o Wal-Mart vai começar a utilizar energia solar em alguns hipermercados; gigantes como General Electric, DuPont, Caterpillar e Alcoa anunciaram uma aliança para pressionar o Congresso e a Casa Branca por uma lei que limite a emissão de gases de efeito estufa.

Fazendo diferença
"Os EUA se encontram em um interessante momento de transição. Existe a consciência ecológica, mas não se sabe ainda o tamanho e a duração desse movimento", explica Leiserowitz. "Os americanos não entendem como individualmente podem fazer a diferença."
Na opinião de Lee Bodner, diretor-executivo da EcoAmerica -ONG dedicada a "fazer com que os americanos ambientalmente agnósticos se engajem"-, o problema é que alguns aspectos ainda soam abstratos demais para uma parcela da população. "Grosso modo, entre os mais escolarizados o aquecimento global faz sentido. Os outros estão preocupados com questões mais imediatas, locais, como a qualidade da água que bebem ou do ar que respiram", comenta. A maioria também pensa que, se houver uma catástrofe, será daqui a 50 ou cem anos.
Herzog não está otimista com a evolução do cenário: "As pessoas estão mais atentas aos riscos ecológicos, é um progresso, mas não é suficiente. Precisa virar uma prioridade na vida de cada um -e isso só se consegue com educação, o que leva tempo". O pesquisador avalia que o governo dos EUA tem papel fundamental, "porque, voluntariamente, vai ser difícil os americanos pouparem energia. São necessárias leis". Ademais, ao dar o exemplo, o país que mais produz gases de efeito estufa pode acabar liderando uma transformação mundial.


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