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Premiê de Timor deixa o cargo para frear crise
Após dois meses de impasse e violência, Alkatiri cede aos apelos do presidente
Acusado de armar milícias, dirigente tentou manobra para se manter, mas apoio de seu partido gerou cascata
de saídas em outras pastas
Firdia Lisnawati/Associated Press
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Timorenses comemoram nas ruas de Dili a renúncia do premiê Alkatiri após quase dois meses de violência e impasse político |
DA REDAÇÃO
O premiê de Timor Leste e
pivô de mais de dois meses de
crise política e caos interno,
Mari Alkatiri, 56, entregou ontem sua carta de demissão ao
presidente Xanana Gusmão.
Ainda no domingo ele tentara uma última manobra para
permanecer no cargo. Pediu
que a Fretilin (Frente Revolucionária de Timor Leste Independente), partido do qual é secretário-geral e que tem a
maioria no Parlamento, publicasse uma moção de confiança
para prestigiá-lo.
O gesto desencadeou dois rápidos episódios que o fragilizaram. Primeiro foi a decisão de
José Ramos Horta, ministro da
Defesa e das Relações Exteriores, de deixar o governo.
Horta foi o Nobel da Paz de
1996, por seus esforços diplomáticos para pôr fim à dominação da Indonésia (1975-1999)
sobre a pequena ex-colônia portuguesa na Ásia.
O segundo episódio foi a intenção, atribuída ontem de manhã a sete outros ministros, de
também deixar o gabinete. Isolado, Alkatiri declarou-se "disposto a renunciar, a dividir a
responsabilidade pela crise e a
evitar a renúncia do presidente
Xanana Gusmão".
Gusmão, um homem também bastante popular, por ter
liderado a guerrilha contra os
ocupantes indonésios, havia
ameaçado deixar a chefia do
Estado na semana passada, caso seu premiê não tomasse primeiro a mesma decisão.
Festa
A renúncia de Alkatiri desencadeou um carnaval de rua em
Dili, capital do país, que ocupa a
metade de uma ilha encravada
no arquipélago indonésio.
Cerca de 200 ônibus e peruas
circularam pela cidade com
suas buzinas disparadas. Grupos com tambores ocuparam as
praças públicas e improvisaram danças que prosseguiram
até altas horas.
Ramos Horta, num palanque
improvisado, disse a seus concidadãos que eles "obtiveram
uma grande vitória como resultado da disciplina" e que dentro
de três dias terão um novo governo. O chanceler demissionário disse que a Fretilin poderá escolher entre três nomes:
Arsénio Bano, até agora ministro do Trabalho e da Reinserção Comunitária, Rui Araújo,
ministro da Saúde, e Ana Pessoa, ex-mulher de Ramos Horta e ministra de Estado e da Administração.
A queda de Mari Alkatiri
coincide com a abertura de inquérito pelo Ministério Público
timorense sobre a acusação
-confirmada por seu ex-ministro do Interior, Rogério Lobato- de que ele decidira distribuir armas do Estado a seus
partidários, que formariam um
misto de milícia e esquadrão da
morte contra adversários.
O plano foi revelado por uma
emissora de TV da Austrália.
Alkatiri deve ser ouvido pelos
promotores na sexta-feira. Lobato está em prisão domiciliar.
O primeiro-ministro da Austrália, John Howard, saudou a
demissão do premiê e disse que
ela permitiria pôr um ponto final à crise. Os australianos têm
a maior parte das forças internacionais de 2.700 homens que
passaram a garantir a segurança interna de Timor Leste depois do colapso, em abril, de sua
polícia e de seu Exército.
A crise surgiu quando quase
600 dos 1.400 militares timorenses se rebelaram e pediram
que Alkatiri abrisse negociações para a elaboração de novos
critérios de promoção, que não
discriminassem originários de
regiões suspeitas de simpatizantes da Indonésia.
Mas ele se manteve intransigente e expulsou os rebelados.
Estes por sua vez "racharam" a
polícia e, sem uma autoridade
institucional armada, o país
caiu em mãos de saqueadores.
Cerca de 30 civis foram mortos, 40 desapareceram e estimados 145 mil foram obrigados
a deixar suas casas, refugiando-se em igrejas, conventos, praças ou acampamentos nas
montanhas próximas à capital.
Com agências internacionais
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