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Sob Calderón, México pode "pausar" a Alca
Arturo Sarukhán, cotado para chanceler se conservador vencer, critica EUA e ação unilateral do Brasil
RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO
A defesa que o México faz da
Alca (Área de Livre Comércio
das Américas) deve sofrer uma
"pausa" enquanto os EUA não
modificarem seus subsídios
agrícolas. Essa será uma das
maiores mudanças na política
externa do país, caso vença o
candidato Felipe Calderón.
Quem diz é o favorito para assumir a Chancelaria mexicana
caso vença o conservador, o diplomata Arturo Sarukhán Casamitjana. Sarukhán foi cônsul
mexicano em Nova York nos
últimos três anos e chefe dos
assessores do ex-chanceler
Jorge Castañeda. Leia trechos
da entrevista que ele deu a Folha no comitê central da campanha de Calderón.
FOLHA - Uma das maiores diferenças entre Brasil e México é a defesa
mexicana da Alca. Não dá para conciliar os interesses dos dois países?
ARTURO SARUKHÁN - Se Calderón
chegar à Presidência, faremos
uma pausa em relação à Alca.
Não estamos convictos de que
sua construção seja o melhor
para os interesses da região enquanto não houver uma resolução de um tema crítico para
nós, o dos subsídios agrícolas.
FOLHA - E em relação ao Brasil? Setores do Itamaraty não consideram
o México como parte da América Latina, e sim como apêndice dos EUA.
SARUKHÁN - É um falso mito.
Setores do Itamaraty pensam
assim e se dedicaram a empurrar essa idéia para tirar o México de temas fundamentais do
debate latino-americano. Nossa intensidade na relação com
os EUA não impede que nos relacionemos com a AL. Como se
o Brasil, por culpa do Mercosul,
não jogasse em outras áreas de
ação. Há uma tentativa de deixar o México fora do jogo.
FOLHA - Os dois países continuarão
a se tratar como rivais sob Calderón?
SARUKHÁN - É falácia que devemos ser sócios naturais. Temos
que buscar temas comuns e
convergências. Os dois países
têm problemas muito sérios,
como redes de tráfico de drogas
e de pessoas, que atingem a trama social de ambos. Temos que
gerar debate no mundo já que
as políticas contra o narcotráfico nas duas últimas décadas
têm se revelado ineficientes.
FOLHA - E em relação ao Conselho
de Segurança da ONU?
SARUKHÁN - Estamos convencidos de que o melhor para o México é um assento não-permanente. E defendemos que o melhor esquema seria um assento
regional, rotativo, para a AL. Se
entrarmos em uma disputa
contra Brasil para ver quem é o
representante da AL, perderemos os dois. Nem vocês conseguiriam o assento permanente,
nem nós o lugar para a região.
FOLHA - O presidente Vicente Fox
não apostou demais na amizade
com Bush e obteve pouco em troca?
SARUKHAN - Temos que exigir
projetos de longo prazo. O
bem-estar das duas sociedades
depende de que exista uma regulação dos fluxos imigratórios
e do mercado de trabalho. Nossa diáspora precisa de mais poder político. É bom que eles
mantenham contatos e laços
com o México. Os mexicanos
devem aprender inglês, tirar título de eleitor, candidatar-se às
eleições. Em dez anos, o diálogo
e o entendimento aumentarão.
O mercado de trabalho ficou
de fora da negociação do Nafta
(Tratado de Livre Comércio da
América do Norte). Abrir os
mercados, que as empresas
possam contratar nos três países, sem barreiras. Isso já acontece, mas está nas sombras,
com 400 mortos mexicanos
por ano na fronteira. É um terrível efeito colateral do crime
organizado, que trafica seres
humanos.
FOLHA - Como o México não conseguiu arrancar uma lei imigratória
mais generosa dos EUA?
SARUKHÁN - Temos 46 consulados mexicanos nos EUA, a
maior rede consular do mundo
em um país. Defendemos os
imigrantes. Mas, em negociação e convencimento, erramos.
Depois do 11 de Setembro, compramos a tese do governo Bush
de não pressionar, não negociar, porque ele faria a reforma
imigratória. Deixamos brechas
que os grupos ultraconservadores ocuparam. O governo mexicano deveria ser mais agressivo
para negociar.
FOLHA - Quando haveria um plano
dos EUA para ajudar as regiões mais
pobres no México?
SARUKHÁN - Nunca estivemos
tão perto de algo assim, mas é
necessário convencer a sociedade americana. Talvez eles
concordem em canalizar investimento produtivo para regiões
com maiores índices de expulsão de mão-de-obra. Investir
no sul e no centro, que não se
desenvolveram como o norte.
FOLHA - E se a esquerda vencer?
SARUKHÁN - [O candidato Andrés Manuel] López Obrador
diz que a melhor política externa é a política interna e que só
visitaria uma vez os EUA. O
México iria se tornar irrelevante na cena internacional.
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