São Paulo, sábado, 27 de junho de 2009

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Perseguição à burca de Sarkozy cria polêmica na França em crise

Presidente acena à esquerda e a feministas, mas contraria muçulmanos, para quem uso é "marginal"

CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Cinco anos após a instituição de uma lei que proíbe o uso de acessórios religiosos nas escolas públicas francesas, o presidente Nicolas Sarkozy insufla os parlamentares da maioria a criarem um projeto de lei contra o uso da burca.
"Sinal de servidão" da mulher, a burca "não é bem-vinda no território da República Francesa ", disse Sarkozy diante de deputados e senadores nesta semana. "Não podemos aceitar no nosso país mulheres prisioneiras atrás de uma grade, excluídas da vida social e privadas de identidade."
Para Stéphane Montclaire, professor de ciência política da Universidade Sorbonne, não há justificativa para o tema aparecer agora. "Não há urgência, e não é da mesma relevância que as questões econômicas e sociais ", avaliou.
Mas, para Montclaire, a incorporação da questão na agenda de Sarkozy tem o objetivo claro de dar um novo fôlego ao seu mandato e aumentar a sua popularidade. "O islã é a segunda religião mais praticada na França, mas há um sentimento de islamofobia que é crescente na população francesa. Sarkozy soube habilmente usar isso no seu discurso."
O presidente do Conselho Francês do Culto Muçulmano, Mohammed Moussaoui, disse estar chocado com a comissão parlamentar criada para discutir a proibição do véu integral. Para ele, esse é um "fenômeno marginal". "Essa iniciativa provoca muitas dúvidas sobre a relevância desse assunto em tempos de crise", disse.
As entidades islâmicas francesas enfatizaram que a burca não é uma roupa recomendada pelo Corão. "Não é uma recomendação religiosa. É uma tradição rara", disse Moussaoui.
Na rua Jean-Pierre Thimbault, no 11º distrito de Paris, há várias lojas de roupas voltadas para a clientela muçulmana. A Folha tentou entrevistar alguns comerciantes para saber sobre a venda de burcas. Nas três lojas visitadas, nenhum quis responder às perguntas. No entanto, ao fundo das lojas, havia à venda em promoção modelos de niqab, um véu integral que deixa apenas os olhos de fora.
O debate sobre a proibição da burca ou de modelos que encubram quase totalmente o rosto encontra eco tanto nos partidos de esquerda quanto nos de direita como o UMP, partido de Sarkozy.
No dia 9 de junho, antes do discurso de Sarkozy, uma proposta de lei do deputado comunista André Gérin previa uma resolução para legislar sobre o tema. "Hoje, nos bairros das nossas cidades, somos afrontados por algumas mulheres muçulmanas com burcas que cobrem integralmente o corpo e a cabeça em verdadeiras prisões ou com niqabs, que deixam apenas os olhos descobertos ", escreveu Gérin. O deputado afirma que ver as mulheres vestidas como mulheres no Irã, no Afeganistão e na Arábia Saudita "é intolerável no solo da República Francesa".
O mesmo discurso é adotado pela associação francesa de direitos das mulheres Ni Putes Ni Soumises (nem prostitutas nem submissas). Sihem Habchi, presidente da associação, enfatiza que a burca é "um símbolo da opressão".


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