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Moore ataca mídia dos EUA e elogia Brasil
DO ENVIADO ESPECIAL A BOSTON
O cineasta Michael Moore afirma que a mídia americana atuou
de forma "embaraçosa" e como
"animadora de torcida" antes da
Guerra do Iraque. "Ninguém é
preso neste país por fazer perguntas. Mais de 900 jovens estão mortos pelo fato de a mídia não ter feito seu trabalho direito", disse
Moore à Folha, referindo-se aos
americanos mortos no Iraque.
O diretor do documentário
"Fahrenheit 9/11" (que no Brasil
foi traduzido como "Fahrenheit
11 de Setembro") elogiou o fato de
o governo brasileiro não ter aceitado os "incentivos" de Bush para
participar do que chama de "coalizão do mal". Ele disse não estar
surpreso com a expectativa em relação a seu filme no Brasil, onde
deve estrear nesta sexta-feira.
Na quarta-feira, a produção,
que faz duras críticas ao presidente americano, será exibida por
Moore num estádio de Crawford
(Texas), onde Bush tem um rancho. O cineasta convidou o presidente para o evento -a Casa
Branca não se manifestou.
Neste final de semana, "Fahrenheit 11 de Setembro" ultrapassou
US$ 100 milhões nas bilheterias
dos EUA, estabelecendo um novo
recorde para documentários -o
anterior era de "Tiros em Columbine", também de Moore.
"Fico feliz com isso, pois a mensagem de meu filme é tirar as pessoas do sofá. Cansamos de dizer
que os EUA são um país dividido
ao meio entre democratas e republicanos. Mas há outros 50% que
nem sequer votam", disse à Folha
enquanto circulava pelo FleetCenter, onde começou ontem a
convenção do Partido Democrata. Leia a seguir a sua entrevista.
(FERNANDO CANZIAN)
Folha - O sr. ficou surpreso com a
expectativa em relação a seu filme
no Brasil?
Michael Moore - Não, pois acredito que as pessoas no Brasil e em
vários outros países do mundo
gostem dos EUA e estejam completamente surpresas com o que
está acontecendo aqui. Creio que
os brasileiros queiram acreditar
que os americanos venham a se
levantar pelo que é certo e justo e a
tirar Bush da Casa Branca.
Meu filme é um exemplo de um
americano, eu próprio, que tenta
fazer as perguntas na hora certa,
cobra as provas e tem certeza de
que somos bons cidadãos neste
planeta. As pessoas no Brasil precisam saber de uma coisa: a boa
notícia é que não é apenas um
americano que se sente dessa maneira. São milhões.
Eu sou apenas o cara sortudo
com a câmera que consegue colocar seus filmes na tela grande. O
fato de que as bilheterias superaram os US$ 100 milhões neste final de semana, de que estamos ao
lado de um grupo reduzido de filmes neste ano, "Shrek" e "Harry
Potter" [risos], significa que milhões e milhões de americanos
concordam comigo.
E quero que as pessoas do mundo inteiro saibam uma coisa sobre os americanos: nós vamos fazer o trabalho que precisa ser feito. Vamos tirar esse sujeito da Casa Branca para que os EUA voltem a ser um bom "cidadão".
Folha - John Kerry será muito diferente de Bush?
Moore - Completamente. Acho
que terei mais chances de tirar férias em seu governo.
Um governo Kerry jamais invadiria um país por causa do seu petróleo ou por interesse de empresas como a Halliburton [já presidida por Dick Cheney, vice de
Bush]. A não ser que exista outro
país no mundo que seja um grande produtor de tomates [a mulher
de Kerry, Tereza Heinz, é dona de
fábricas de ketchup]...
Folha - O Brasil produz muitos tomates...
Moore - Então é melhor vocês
irem se preparando [risos].
Folha - Como o sr. viu a posição do
Brasil de não apoiar a guerra?
Moore - Fiquei orgulhoso com o
fato de o Brasil ter optado por não
ser um dos membros da "coalizão
do mal" montada por Bush. Foi
uma decisão muito corajosa, pois
tenho certeza de que a Casa Branca deve ter oferecido ao Brasil
muitos "incentivos" para que participasse dessa farsa. Creio que o
povo americano deve um agradecimento profundo ao Brasil pelo
fato de o país ter resistido a essas
pressões em benefício do mundo.
Folha - Como o sr. avalia o comportamento da mídia americana
antes da guerra?
Moore - Foi um momento de
grande embaraço para a nossa
mídia, que atuou apenas como
animadora de torcida. Isso é absolutamente chocante em um
país onde você tem o direito de fazer qualquer pergunta, de criticar
abertamente qualquer pessoa.
Ninguém pode ser preso neste
país por fazer perguntas.
De certo modo, eu acabei me
sentindo sozinho nisso tudo, me
perguntando: "Onde estão meus
irmãos e irmãs?".
A maioria neste país não tem câmera, microfones ou acesso à Casa Branca. Os jornalistas que têm
esses meios não fizeram as perguntas que deveriam ter sido feitas antes da guerra. Ao contrário,
pregaram pequenas bandeiras em
estúdios de TV, se enrolaram na
bandeira americana e deram carta-branca a essa administração.
Mais de 900 de nossos jovens foram mortos no Iraque como resultado do fato de a mídia americana não ter feito o seu trabalho.
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