São Paulo, quinta-feira, 27 de outubro de 2011

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Na China, dívida faz empresários fugirem

Quase 100 donos de empresa saíram de Wenzhou, cidade vista como vanguarda do setor privado no país, e 2 se mataram

Crédito oficial escasseia e agiotas cobram juros de até 180% ao ano; governo tenta evitar uma crise generalizada

DO ENVIADO A WENZHOU

Há dois meses, Zhuang Cheng, 19, se tornou um dos 2.000 funcionários da Xintai, a maior fabricante de óculos de Wenzhou e talvez da China. Com salário de R$ 556, queria poupar para abrir um negócio.
Não houve tempo: em 23 de setembro, sem aviso prévio, a empresa fechou. Três dias antes, seu dono, Hu Fulin, fugira para os EUA.
O caso da Xintai não é o único. Considerada a vanguarda do empreendedorismo privado chinês, Wenzhou viu 94 pequenos e médios empresários sumirem em poucas semanas, deixando dívidas enormes e milhares de funcionários furiosos. Outros dois cometeram suicídio.
O roteiro da bancarrota é parecido. Desde 2009, vários exportadores viram sua margem de lucro diminuir devido à desaceleração mundial, à valorização do yuan e ao crescente custo da mão de obra e da matéria-prima.
Por outro lado, essas empresas se beneficiaram da expansão de crédito feita pelo governo a partir de 2009.

AGIOTAS
Só que essa fonte começou a secar em 2010, quando o banco central chinês passou a elevar os juros e o depósito compulsório bancário, para conter a inflação decorrente do superaquecimento.
Com as portas dos bancos fechando, empresários recorreram a empresas de crédito e agiotas em busca de financiamento, mas a juros que chegaram a incríveis 180% ao ano para empréstimos de curto prazo.
Boa parte dessas dívidas pagava outras dívidas, gerando uma bola de neve.
No caso da Xintai, a dívida alcança R$ 547 milhões, diz a imprensa local. Desse total, R$ 219 milhões foram contraídos em bancos, com juros mensais de R$ 1,4 milhão.
Já o dinheiro obtido com agiotas soma R$ 328 milhões, com juros mensais de R$ 5,5 milhões. Impagável para uma empresa que faturou R$ 74 milhões no ano passado.
A ameaça de uma crise generalizada em Wenzhou fez o governo chinês agir. Neste mês, o premiê Wen Jiabao passou dois dias na cidade em reuniões com empresários e governos locais. O governo também aprovou pacote de ajuda que expande linhas de crédito e reduz o Imposto de Renda até 2015.
A Prefeitura de Wenzhou pagou salários e compensações de Zhuang e de todos os funcionários das fábricas fechadas. Aparentemente, Pequim também está pressionando os empresários desaparecidos: três reapareceram, inclusive Hu Fulin, que pediu desculpas em entrevista.
Há motivos para preocupação. Cerca de 80% dos empregos na China são gerados por pequenas e médias empresas, responsáveis por cerca de 60% da produção industrial.
Em Wenzhou, as empresas fechadas são uma porção muito pequena do universo de 400 mil pequenas e médias da região, que tem cerca de 9 milhões de habitantes.
Zhuang já conseguiu novo emprego numa fábrica de óculos vizinha, assim como seus amigos. A exceção é sua mãe. "Ela trabalhava na Xintai havia dois anos e espera a reabertura. Ela acredita que vai recuperar o emprego."
(FABIANO MAISONNAVE)


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