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Brasil é contra ruptura,
diz chanceler de Lula
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O futuro chanceler do Brasil,
Celso Amorim, 60, defendeu ontem o envio de gasolina à Venezuela e respondeu às críticas da
oposição venezuelana, que vê "ingerência indevida" nessa ajuda:
"O Brasil tem compromisso com
o governo constitucional, eleito
democraticamente", disse ele.
Embaixador em Londres, com
experiência tanto em negociações
políticas quanto econômicas, ele
explica que a relação Brasil-Venezuela é estratégica: "É impossível
imaginar um Brasil estável sem
uma região totalmente estável".
Falando à Folha por telefone ele
resumiu o sentido da política externa do futuro governo: "Pretendemos um sentido humanista nas
nossas relações, que vá além da
ótica fria dos mercados. Eles [os
mercados] também são importantes, mas não são tudo. São instrumentos de uma política mais
global de justiça social".
Folha - O sr. acha correto enviar
gasolina à Venezuela e "furar a
greve" contra o governo Hugo Chávez? A oposição venezuelana acusa
o Brasil de interferência em assuntos políticos internos.
Amorim - Existe uma crise, uma
situação realmente difícil, mas o
importante é que o Brasil mantém
relações cordiais e respeitosas
com o governo constitucional da
Venezuela, um governo eleito democraticamente. Essas relações
implicam cooperação mútua.
Não é interferência defender o
diálogo e o entendimento e manter boas relações com o governo
constitucional. Isso vale para hoje
como valerá no futuro. O que não
se pode é tentar impor uma solução de cima para baixo. Aliás,
nem de baixo para cima, nem do
lado para o lado. Uma política de
ruptura não convém nem para a
Venezuela nem para a região.
Folha - O Brasil, o México e o Peru
têm tido uma posição diferenciada
na crise venezuelana em relação
aos EUA, que são claramente anti-Chávez. Isso pode criar ruídos nas
relações do Brasil com os EUA?
Amorim - Não vou comentar a
posição americana porque seria
leviano da minha parte. Tenho falado sempre com o embaixador
[em Caracas] Rui Nogueira e com
o Marco Aurélio Garcia [assessor
do PT para a área internacional],
mas acompanho a crise venezuelana, por enquanto, à distância.
Folha - Lula e Garcia sempre dizem que a prioridade da política
externa será, nesta ordem, a América do Sul, a América Latina e as
Américas. Nesse sentido, a Venezuela não é a prioridade das prioridades, mesmo em relação aos EUA?
Amorim - A Venezuela é um parceiro muito importante, porque
tem muitas afinidades com o Brasil. São afinidades culturais, de clima, até o povo é muito parecido
com o nosso. Também tem uma
larga fronteira com o Brasil e é um
país rico em fontes de energia. O
Brasil, portanto, tem interesse em
manter relações próximas e produtivas com a Venezuela. O nosso
partido é o da constitucionalidade
e da democracia.
Folha - Mas o risco de golpe é ainda muito real na Venezuela.
Amorim - Golpes são inaceitáveis
em qualquer hipótese. No caso da
Venezuela, temos de contribuir
efetivamente para reduzir esse
risco. E isso não é interferência
em assuntos internos, mas uma
posição de defesa da democracia e
da constitucionalidade. A intenção, desde o início, não era o Brasil se sobrepor, mas contribuir para uma solução negociada.
Folha - Há dúvidas quanto à sua
convivência com o Marco Aurélio
Garcia. O sr. não teme uma interferência externa no Itamaraty?
Amorim - Nós nos conhecemos
há muitos anos e agora estamos
descobrindo até pontos de contato que nem lembrávamos mais.
Além do mais, o Brasil tem de se
acostumar com essas coisas tão
normais, como o presidente eleito
enviar um emissário a outro país.
Isso acontece a toda hora nos
EUA e não é coisa para chanceler.
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