São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2007

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Israel enterra solução unilateral

Três anos após ser lançado, projeto de retiradas não negociadas é derrotado por fiascos em Gaza e no Líbano

Criado por Sharon, conceito dá lugar à volta do diálogo com palestinos moderados, mas processo de paz pode esbarrar em líderes fracos

MARCELO NINIO
DA REDAÇÃO

Está reaberta a temporada de negociações entre israelenses e palestinos. Três anos após o ruidoso nascimento do projeto de retiradas unilaterais, que dominou a política externa do país e ajudou a eleger o premiê Ehud Olmert, o conceito está morto e enterrado. Diante do caos em Gaza e do fiasco na guerra do Líbano -ambos territórios desocupados por Israel unilateralmente-, a negociação voltou à ordem do dia.
Uma prova disso é a profusão de iniciativas destinadas a retomar o processo de paz com os palestinos que invadiu a imprensa israelense. Em visita à região, há duas semanas, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, disse que o encontro do próximo mês entre Olmert e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, será o mais importante em seis anos.
"Após uma retirada [de Gaza] que fracassou e uma retaliação [no Líbano] que virou guerra, há um consenso nacional: não há como a força bruta e a ação unilateral resolverem o conflito, e é impossível efetuar uma retirada sem negociações", escreveu Yoel Marcus, o mais influente articulista do jornal israelense "Haaretz".
Foi numa conversa com Marcus, em 2004, que o premiê Ariel Sharon pronunciou pela primeira vez a idéia de deixar Gaza unilateralmente. O argumento era simples: na ausência de um parceiro palestino para o diálogo, restava a opção unilateral. A decisão foi saudada com entusiasmo pela maioria dos israelenses, cansados da cara e estrategicamente irrelevante ocupação de Gaza.
A idéia foi elogiada até por pacifistas, que se perguntavam se o general que deu impulso à ocupação de terras palestinas e comandou a invasão do Líbano, em 1982, havia mudado de lado.

Ilusão
"O plano unilateral foi uma ilusão. Como crer que os palestinos aceitariam o que Israel lhes dava sem discussão?", disse à Folha Paul Scham, do Instituto de Oriente Médio, em Washington. "A esquerda israelense jamais gostou da idéia, mas, como não tinha força, seguiu o fluxo, concluindo que qualquer retirada era melhor que nenhuma. A direita, que nunca aceitou concessões, também ficou desconfiada."
Embora executada em tempo recorde e sem provocar a temida "guerra entre irmãos", a retirada de Gaza confirmou as piores previsões da esquerda e da direita. Sem o Exército por perto, terroristas palestinos intensificaram o disparo de mísseis contra Israel.
Para piorar, a retirada deu fôlego político ao Hamas, o grupo islâmico dos homens-bomba responsável por dezenas de atentados em Israel, ajudando-o a chegar ao poder nas eleições de janeiro do ano passado. Seis meses depois, o seqüestro de dois soldados pelo Hizbollah deflagrou uma nova guerra no Líbano, de onde Israel também saíra unilateralmente em 2000.
Os políticos israelenses não demoraram a embarcar na velha idéia, numa corrida pelo melhor plano de paz. O primeiro movimento partiu da chanceler Tzipi Livni, a nova estrela da política local, que passou a defender o diálogo com o mesmo entusiasmo com que apoiara o unilateralismo.
Em seguida vieram propostas semelhantes do ministro da Defesa, Amir Peretz, e do ministro dos Transportes, Shaul Mofaz. Oportunismo?
"Pesquisas mostram que os israelenses querem paz. Os políticos sabem que podem ganhar pontos com isso", disse à Folha Gershon Baskin, presidente do Centro de Pesquisa Israel-Palestina, lembrando o elo entre as áreas. "É como dizia Henry Kissinger: em Israel não há política externa, tudo é política interna."
Para Baskin, porém, não será na negociação do próximo mês que o processo de paz entre palestinos e israelenses avançará: "Olmert e Abbas estão enfraquecidos, e Bush perdeu a autoridade para mediar. Nessas circunstâncias, será mais um diálogo que não levará a nada."


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