São Paulo, domingo, 28 de março de 2004

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ORIENTE MÉDIO

Para analistas, grupo terrorista tentará ser mais letal após eliminação de Yassin, mas não se compara à Al Qaeda

Assassinato de líder pode fortalecer Hamas

GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO

O grupo terrorista Hamas pode até aumentar a escala de suas ações após a morte do seu líder, o xeque Ahmed Yassin, na semana passada em ataque de Israel. Porém dificilmente essa organização palestina, responsável por dezenas de atentados contra israelenses, se converterá em uma força da dimensão da rede terrorista Al Qaeda, que realiza operações que deixam centenas de mortos.
A avaliação é de especialistas ouvidos pela Folha, que, por outro lado, consideram provável que o Hamas se fortaleça nos territórios palestinos, especialmente na faixa de Gaza, de onde Israel afirma que se retirará nos próximos meses.
"O Hamas é uma organização cujos militantes não são altamente treinados, apesar de extremamente comprometidos com a causa que defendem. Eles não têm a habilidade para realizar as ações da Al Qaeda", diz o professor palestino Issam Nassar, da Universidade Al Quds, em Jerusalém.
O professor lembra que o Hamas afirmou que não pretende atacar alvos fora de Israel ou dos territórios ocupados na guerra árabe-israelense de 1967, apesar de, no calor do dia do assassinato de Yassin, o grupo ter ameaçado agir contra americanos e israelenses fora de Israel -mais tarde, os líderes voltaram atrás.
Yoram Shweitzer, especialista em terror do Centro Jaffee para Estudos Estratégicos, em Tel Aviv, concorda com Nassar. "A ideologia e a estrutura do Hamas indicam que ele não agirá nos moldes da Al Qaeda em outras partes do mundo. Não é prático."
O especialista israelense ressalta, no entanto, que o Hamas já tentou operações de larga escala em Israel e nunca obteve o sucesso esperado. O recente ataque contra o porto de Ashdod, o segundo mais movimentado de Israel, deveria ter sido de uma proporção bem maior do que o seu resultado final -que deixou ao menos dez mortos.
Considerando o terrorismo algo difícil de prever, o professor Rashid Khalidi, chefe do Instituto de Oriente Médio da Universidade Columbia, em Nova York, afirma que é "impossível saber" se o Hamas agirá como a Al Qaeda.
Para Khalidi, por enquanto, só se pode prever que o Hamas se fortalecerá, ao menos a curto prazo. Nassar, da Universidade Al Quds, afirma que tudo dependerá de como o Hamas responderá ao assassinato de Yassin. O editor do diário libanês "The Daily Star", Rami Khoury, escreveu em um artigo que o Hamas deve se tornar muito mais letal, "dividido em pequenas células autônomas menos disciplinadas" e mais violentas.
O israelense Shweitzer discorda deles, apesar de ressaltar que o Hamas pode "qualificar-se" com o apoio do grupo extremista islâmico libanês Hizbollah e do Irã. "Mais forte, tenho certeza, o Hamas não ficará." Essa fraqueza, acrescenta o israelense, não significa que o grupo terrorista não responderá à morte de Yassin. "Eles [os líderes do Hamas] devem estar planejando ataques contra alvos simbólicos de Israel. Tentarão, sim, atacar as lideranças israelenses, inclusive Sharon. Mas as forças de combate ao terrorismo de Israel sabem disso e estão preparadas."
Os dois principais líderes da organização depois da morte de Yassin, Abdel Aziz Rantisi e Khaled Meshaal, disseram que vão alvejar os líderes israelenses. "Como o inimigo atingiu o nosso líder, um símbolo como Ahmed Yassin, é legítimo que a nossa resistência responda contra as lideranças sionistas", disse Meshaal.
Meshaal ainda é visto como um pouco mais moderado do que Rantisi, considerado um linha-dura, que pode radicalizar ainda mais o Hamas. "Yassin aceitava tréguas contra israelenses. Rantisi é mais radical", afirma Khalidi, da Universidade Columbia.
Copiando os americanos no Iraque, o Hamas na semana passada distribuiu um baralho com os rostos de autoridades israelenses, consideradas as mais procuradas pelo grupo. O diário israelense "Haaretz" lembra que, para demonstrar a radicalização do grupo, entre os rostos que lá aparecem, ao lado do de Sharon, está o do esquerdista israelense Yossi Sarid, um dos principais críticos e opositores do premiê.
Nos ataques contra outros líderes do Hamas -como Ismail Abu Shanab e Salah Shehada, ambos bem menos importantes que Yassin-, a resposta não foi contra líderes israelenses, e sim contra os alvos tradicionais -civis.
Mas, se a reação do Hamas contra Israel ainda é uma incógnita, há um consenso de que o grupo poderá sair fortalecido nos territórios palestinos, especialmente na faixa de Gaza.
"A Autoridade Nacional Palestina [presidida por Iasser Arafat] está cada vez mais fraca", diz Khalidi, acrescentando que a ANP e o Hamas já estão se enfrentando.


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