São Paulo, sexta-feira, 28 de maio de 2004

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Jornalista francês é processado por entrevistar imã extremista

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O jornalista francês Philippe Brunet-Lecomte, diretor da revista mensal "Lyon Mag", está sendo processado por "apologia do crime" em razão da publicação de entrevista em que um dirigente muçulmano de um subúrbio da cidade de Lyon defendeu, em caso de infidelidade, o direito de os maridos surrarem suas mulheres.
O imã Abdelkader Bouziane, de nacionalidade argelina, foi expulso da França. Mas recorreu à Justiça e obteve em primeira instância o direito de retornar.
A entidade Repórteres Sem Fronteira escreveu ao ministro francês da Justiça, Dominique Perben, qualificando o processo contra o jornalista de "abusivo".
"Associar declarações condenáveis do imã e o jornalista que o entrevistou terá conseqüências nefastas à liberdade de informação na França", disse a entidade.
A "Lyon Mag" havia sido condenada no ano passado a uma multa de 254 mil (R$ 934 mil) por reportagem que os produtores do beaujolais consideraram ofensiva à imagem daquele vinho.
Eis os principais trechos da entrevista do jornalista agora novamente processado.
 

Folha - Qual lei foi evocada na tentativa de processá-lo?
Philippe Brunet-Lecomte -
Nós, da revista "Lyon Mag", temos más relações com o Judiciário da cidade de Lyon. Somos impertinentes, fazemos com freqüência críticas aos tribunais. A Justiça da cidade não gosta de nós, o que nos parece bastante claro. Os juízes talvez estejam nos mandando um recado para que baixemos um pouco o tom de nosso jornalismo.

Folha - A organização Repórteres Sem Fronteira protestou contra a ação judicial. Os sindicatos franceses se manifestaram?
Brunet-Lecomte -
Não, até o momento. Os sindicatos franceses se posicionam bem mais sobre desemprego ou salários.

Folha - Como interpretar a reação do governo francês contra alguns muçulmanos extremados?
Brunet-Lecomte -
Creio que o governo tem uma diretriz de curto prazo. Procura obter efeitos na mídia. Prende um ou dois imãs, finge que se interessa pelo problema, mas não o estuda seriamente. Não está atento sobretudo ao extremismo de certos imãs em subúrbios franceses.

Folha - O atual processo parte dos mesmos juízes que o condenaram no caso do vinho beaujolais?
Brunet-Lecomte -
Com certeza. Entramos com um recurso. E temos a intenção de levar o caso à Corte Européia dos Direitos Humanos, se assim for necessário.

Folha - Quais os riscos reais, agora, de uma condenação?
Brunet-Lecomte -
Esperamos não ser condenados. Mas as decisões da Justiça francesa são sempre inesperadas e incompreensíveis. Há hoje entre os juízes uma tendência a acreditar que a liberdade de imprensa é excessiva na França.

Folha - Os grandes jornais franceses abordaram o caso?
Brunet-Lecomte -
Sim, e o fizeram com bastante destaque. O que a maior parte dos jornais disse é que era escandaloso esse procedimento para nos intimidar. Entrevistar alguém não é estar de acordo com o entrevistado.


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