São Paulo, quinta-feira, 28 de maio de 2009

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análise

Ações de Kim podem não ter fundo racional

DO "INDEPENDENT"

Para a Coreia do Norte, apresentar uma face hostil não é uma novidade. Mas a atual crise é especialmente perigosa porque é difícil entender qual é o jogo de Pyongyang.
Nos últimos anos, os gestos belicosos do regime foram interpretados como esforços para extrair assistência de seus vizinhos e forçar os EUA a negociar. Essa, porém, não pode ser a explicação agora, porque uma delegação americana visitou a região neste ano. Os canais de comunicação estão abertos.
Já foi sugerido que essa crise pode ter sido resultado de um esforço de Kim Jong-il para reforçar sua autoridade doméstica ou organizar uma transição tranquila. Mas essa explicação tampouco convence, porque, ao fazer um novo teste nuclear, Pyongyang alienou a China, seu único aliado de peso.
Isso suscita uma possibilidade aterrorizante: a de que as manobras de Pyongyang representem não uma política implementada racionalmente, e sim um momento de paranoia frenética. O mundo conseguiu evitar o holocausto nuclear na Guerra Fria porque podia confiar em que a União Soviética agisse de maneira racional.
Se a mesma suposição não valer para a Coreia do Norte, sobe consideravelmente o perigo que ela representa. O mundo, liderado pelos EUA, tentou de tudo para ajudar a Coreia do Norte a sair do isolamento. Bill Clinton buscou aproximação diplomática, sem resultado.
George W. Bush adotou abordagem mais hostil, classificando a Coreia do Norte como parte do "eixo do mal", o que aprofundou o isolamento do regime, mas pouco fez para moderar seu comportamento. Por fim, Barack Obama ofereceu aos inimigos dos EUA, entre os quais a Coreia do Norte, um novo começo. Mas a mão que Obama estendeu foi rejeitada.
A comunidade internacional, na falta de ideias melhores, avança na direção de uma renovação das sanções e de um plano para revistar todos os barcos provenientes do Norte para evitar o contrabando de material nuclear para fora do país. Isso só alimenta ainda mais a paranoia de Pyongyang.
No entanto, por mais precária que pareça a situação, é possível que uma oportunidade tenha surgido. O afastamento entre Pyongyang e Pequim pode se provar um erro fatal. Caso a China suspenda o envio de petróleo e alimentos, os dias da Coreia do Norte podem estar contados. A China sempre hesitou em tomar medidas que desestabilizassem a Coreia do Norte, até agora, por medo de que o colapso do regime resultasse em uma onda de refugiados famintos atravessando suas fronteiras.
Mas Pequim talvez decida agora que esse seria o mal menor. Se essa mudança de pensamento se provar possível, a resposta mais astuta do restante da comunidade internacional seria recuar e permitir que a China discretamente retire o apoio a seu velho dependente.
Assim, o que parece ter sido um espasmo de perigoso irracionalismo da parte de Pyongyang talvez venha a ser o primeiro toque dos sinos fúnebres para o regime da Coreia do Norte.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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