São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

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EUA

Escândalos corporativos derrubam popularidade de Bush e podem levar democratas a retomar o controle do Congresso

Economia ameaça republicanos em eleições

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

"É a economia, estúpido." Com esse mote, criado pelo consultor político James Carville, Bill Clinton decifrou o desejo dos eleitores norte-americanos e derrotou o então presidente, George Bush, nas eleições presidenciais de 1992.
Dez anos depois, o mesmo lema ameaça a popularidade de George W. Bush, o segundo "Bush" na Casa Branca, e o desempenho do Partido Republicano nas eleições legislativas de novembro.
Um em cada cinco eleitores republicanos admite que poderá votar em candidatos democratas devido aos escândalos corporativos, à queda das Bolsas e ao receio de que esses dois fatores contaminem a economia real dos EUA. Seis em cada dez americanos perderam dinheiro nas Bolsas de Valores nos últimos seis meses.
No dia 5 de novembro, os norte-americanos irão renovar um terço do Senado e a Câmara dos Deputados. Serão eleições decisivas. Os democratas precisam obter sete cadeiras dos republicanos para conquistar a maioria na Câmara dos Deputados.
No Senado, os republicanos precisam adicionar um senador à sua bancada para retomar o controle da casa, que perderam no ano passado. Um Congresso controlado pela oposição poderia comprometer as chances de Bush de reeleger-se à Presidência nas eleições de 2004.

Popularidade
Bush ainda é um presidente extremamente popular. Para 62% da população, ele ainda tem "as qualidades necessárias a um presidente" (dados de pesquisa NBC/"The Wall Street Journal") e tem sido eficaz na guerra contra o terror.
No entanto a popularidade do presidente caiu de seu pico de 90%, registrado semanas após os atentados de 11 de setembro, para um patamar de 70%. As pesquisas apontam uma tendência de queda nos índices de aprovação a seu governo, somada a uma desconfiança com relação à sua isenção para atacar as grandes corporações do país.
Para a maioria dos americanos, os problemas econômicos preocupam mais que o terrorismo e o país está caminhando na direção errada. Segundo pesquisa recente CBS/"The New York Times", só 38% confiam nas decisões de Bush para controlar as fraudes das grandes corporações; 50% acham que a administração toma decisões erradas sobre economia.
Nas ruas de cidades como Washington e Nova York, os americanos reagem de formas distintas à crise. Jovens, com cartões de crédito nas mãos, continuam consumindo como se a bolha da economia não tivesse estourado em 2000. Ao mesmo tempo, a população acima de 40 anos mudou seus hábitos, frequenta menos restaurantes e fugiu dos shopping centers.
Uma classe de descontentes surgiu no país. Em 2001, antes dos escândalos corporativos, as falências individuais já haviam atingido 1,4 milhão, recorde histórico que deverá ser batido em 2002. Idosos foram obrigados a voltar a trabalhar depois de perderem suas economias nas Bolsas. Para cobrir dívidas contraídas para investir nas Bolsas, milhares de americanos venderam suas próprias casas para, depois, refinanciá-las. Essa classe confia em Bush para protegê-la contra terroristas, mas desconfia de suas intenções no campo econômico.
O presidente transformou-se em personagem do escândalo corporativo ao ser obrigado a responder a acusações de que, em 1989, quando era membro do conselho de diretores e do comitê de auditoria da companhia Harken Energy, teria se beneficiado de operações fraudulentas similares às que destruíram a credibilidade de companhias norte-americanas como a Enron e a WorldCom.
Segundo Robert Shaphiro, cientista político da Universidade Columbia, há uma divisão na cabeça do eleitor norte-americano. "O público está usando o terrorismo e a segurança nacional para julgar a performance do presidente, mas não para decidir seu voto em novembro", disse ele.
Os americanos não vêem em Bush a mesma capacidade de encontrar uma saída político-institucional para a crise como a oferecida ao país pelo democrata Franklin Roosevelt, que ocupou a Casa Branca depois do crash de 1929.
Para restabelecer a confiança dos mercados, Roosevelt criou a SEC (o xerife dos mercados nos EUA) e colocou empresários na cadeia. Bush, por sua vez, esforça-se para evitar que essa mesma SEC divulgue dados sobre as transações suspeitas que fez com as ações da Harken.

Componente histórico
Os eleitores vêem nas eleições de novembro uma chance de se contraporem às políticas domésticas de Bush para a economia. Mas também há um componente histórico guiando os eleitores. Desde 1934, eleitores tendem a votar na oposição nas "midterm elections", como são chamadas as eleições que acontecem no meio dos mandatos presidenciais.
Essa tendência se verifica independentemente da popularidade dos presidentes, como um mecanismo natural dos americanos para reforçar o controle da Casa Branca por meio do fortalecimento da oposição no Congresso.


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