São Paulo, sexta-feira, 28 de outubro de 2011

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ANÁLISE CRISE EUROPEIA

Acerto é um remendo melhorado e tardio por parte da Europa

"Perdão" da dívida grega virá atrasado, se vier; cúpula alivia crise no curto prazo, mas problemas continuam


DIFÍCIL EVITAR O CINISMO SOBRE A "HAPPY HOUR" NO MERCADO COM O ACORDO

VINICIUS TORRES FREIRE
COLUNISTA DA FOLHA

É difícil não reagir com cinismo à "happy hour" no mercado devida ao "acordo de cúpula" sobre o que fazer do tumulto europeu.
"Happy hour" ou "happy day", a alegria não vai durar muito nem para os donos do dinheiro grosso. A não ser que os líderes políticos europeus se desmintam outra vez e salvem a banca do rombo que será deixado pela Grécia.
Do que se estava rindo ontem? O tal acordo, outro remendão, embora melhorado, é um atestado de incompetências no passado que deixa aberta a porta para inépcias nas próximas semanas.
Primeiro, trata-se de um arranjo que reconhece, tardiamente, depois de imensos danos à economia mundial, que a Grécia não tem como pagar sua dívida, o que Alemanha e Banco Central Europeu se recusavam a admitir desde o início da crise, em 2009.
Segundo, o programa de arrocho fiscal, de corte de gastos públicos, continuará em toda a eurozona, o que vai puxar o crescimento europeu para baixo, ainda. A Itália, por exemplo, vai conseguir pagar suas dívidas com mais uma década de crescimento per capita quase zero (para nem falar de Portugal etc.)?
Terceiro, a reação dos bancos à "ordem" de melhorar seu nível de capitalização deve ser má notícia para o crescimento econômico da eurozona. Para lidar com as supostas e ainda desconhecidas perdas que terão com o calote grego "amigável", os bancos terão de levantar mais dinheiro em relação ao total de seus ativos ("empréstimos").
Mas, em vez de aumentar seu capital vendendo ações ora baratas, o que prejudica os atuais acionistas, tendem a emprestar menos ou a vender ativos (isto é, tendem a encolher os seus negócios).
Vão apelar para a "desalavancagem". Enfim, os governos podem entrar com dinheiro nos bancos, estatizar parte deles, evitar quebras e, assim, salvar a pele de grandes investidores/credores.
Quarto, está bem mal contada essa redução de 50% da dívida grega em títulos. Parece que vão trocar, por exemplo, um título de € 1000 por um de € 500 (valores apenas a título de ilustração).Mas quais serão os prazos e as taxas de juros dos empréstimos "reestruturados"? Com quais garantias? De quem? Dos governos europeus?
Sem saber tais coisas, não dá para dizer que a finança levou uma tunda de 50%.
Supondo que se corte de fato a dívida grega pela metade e a banca não perca metade do seu dinheiro (dados juros, garantias e prazos melhores, talvez), quem fica com a conta é o público.
Quinto, o pacote inteiro apenas alinhava diretrizes e intenções. O tamanho do "calote" a ser aceito ainda precisa ser negociado. E o novo fundo europeu para tapar rombos vai chegar a ter € 1 trilhão por qual tipo de mágica?


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