São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 2008

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"Nova Déli tem de assumir seus erros", afirma especialista

Para Rohan Gunaratna, ataques são "banho de sangue indiscriminado e sem reivindicações objetivas" que refletem terrorismo pós-Al Qaeda

Estudioso do tema diz que inspiração vem da rede de Bin Laden, critica a Índia por apontar culpados externos e prevê mais atentados

SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os atentados de Mumbai refletem um caso clássico de terrorismo no século 21 -um banho de sangue indiscriminado e sem reivindicação.
Essa é a avaliação de um dos maiores especialistas mundiais no assunto: o cingalês Rohan Gunaratna, autor do livro "Inside Al Qaeda: Global Network of Terror" (dentro da Al Qaeda: rede global do terror) e pesquisador do Centro para o Estudo de Terrorismo da Universidade de St. Andrews (Escócia).
Em entrevista à Folha por telefone, Gunaratna criticou a Índia por buscar apontar culpados externos e previu mais ataques contra hotéis.

 

FOLHA - O atentado tem alguma relação com o terrorismo do tipo praticado pela Al Qaeda?
ROHAN GUNARATNA
- Até podem ter se inspirado na Al Qaeda, principalmente no modo operacional. Atacar alvos ocidentais icônicos para causar mortes em massa é marca registrada da Al Qaeda. Mas acho que o vínculo não vai além disso.

FOLHA - Qual é a motivação dos autores do massacre?
GUNARATNA
- O grupo que cometeu os ataques é indiano e não está vinculado a nenhum Estado. Os terroristas estimam que as minorias muçulmanas foram destratadas e sofreram muito na história da Índia e hoje buscam meios de vingar o que consideram injustiças.
Mas essas justificativas não procedem. O governo indiano respeita e trata com atenção as questões ligadas às minorias islâmicas. Há muçulmanos ocupando cargos importantes em todas as esferas do país.

FOLHA - Mesmo com a dimensão e a repercussão da carnificina, o senhor acredita que os terroristas de Mumbai não têm nenhuma reivindicação específica?
GUNARATNA
- Os autores queriam atacar indiscriminadamente pessoas que não têm nada a ver com os conflitos étnicos e religiosos da Índia. Não há reivindicação ou mensagem além disso. É um caso típico de terrorismo [pós-Al Qaeda].

FOLHA - Houve mesmo participação externa nos ataques, como sustenta Nova Déli?
GUNARATNA
- Os governos indianos têm mania de apontar o dedo para o Paquistão ou Bangladesh na hora de resolver problemas. O culpado sempre é o outro. As autoridades da Índia precisam aprender a assumir os próprios erros, para crescer e amadurecer. Só assim o país se tornará uma grande potência.

FOLHA - O que se sabe sobre o grupo que assumiu os ataques?
GUNARATNA
- Não existe nenhuma organização terrorista chamada Mujahedin do Deccan. É muito provável que seja apenas um nome diferente para designar os Mujahedin da Índia, que vêm atacando o país nos últimos anos. Os Mujahedin da Índia adotaram uma nomenclatura diferente para despistar as autoridades. Sinal disso é o próprio nome. Deccan significa "Sul", o que sinaliza a tentativa de confundir, já que a maior parte dos grupos muçulmanos radicais estão concentrados no norte.

FOLHA - Os hotéis parecem ter se tornado alvos preferenciais dos terroristas.
GUNARATNA
- O ataque de Mumbai aconteceu dois meses depois do atentado ao Marriott de Islamabad [Paquistão], que deixou 56 mortos. Diante da dificuldade em atingir embaixadas e outros alvos diplomáticos, os terroristas tendem a alvejar cada vez mais hotéis freqüentados por estrangeiros, que passam a ser encarados como braços das embaixadas.


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