São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2008

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A REVOLUÇÃO AOS 50 / O IMPÉRIO E A ILHA

Em equilíbrio precário, Cuba espera Obama

Após transferência formal de poder pacata, ilha paira em suspenso com sua economia encurralada por crise e furacões

Meio século após chegarem ao poder, os Castro podem ter de reinventar sua relação com os EUA; desvio moral e apatia de jovens são desafio


DA REPORTAGEM LOCAL

Com o ensaio reformista de Raúl Castro na agricultura congelado pelo efeito da crise mundial e dos furacões que levaram 20% do PIB do país neste ano, a Revolução Cubana completa 50 anos em equilíbrio precário.
O próximo lance no lento xadrez do regime parece ser reagir à posse de Barack Obama -quer porque ela pode trazer algum alívio econômico, quer porque represente um desafio à identidade do castrismo em si.
Meio século depois de os rebeldes declararem vitória em 1º de janeiro de 1959, o regime espera o resultado da orquestrada transição do poder das mãos de Fidel Castro ao irmão, Raúl, em fevereiro, numa das últimas ditaduras de Partido Comunista a sobreviver no mundo.
Mas sua economia está acossada. Como não se espera impulso grande da aliada-mor Caracas, às voltas com a queda do preço do petróleo, uma injeção maior de dinheiro no país dependerá da liberação de viagens de cubano-americanos à ilha e do envio de remessas -promessas de Obama.
Esse passo de Washington, se vier, exigirá, por sua vez, um reposicionamento também de Cuba. O presidente eleito dos EUA será, desde Jimmy Carter (1977-81), o primeiro ocupante da Casa Branca a ver nos Castro possíveis interlocutores.
Ainda que ninguém espere um encontro em breve, Fidel e Raúl já acenaram que estão dispostos a negociar. "O principal legado de Fidel é o nacionalismo cubano nos termos da oposição aos EUA. O desafio crônico do país é superar esse legado", diz Maurício Font, cubano-americano da City University de Nova York. "Cuba conseguirá sair dessa trincheira?"
Outro legado, mais grave e profundo, também pende neste cinqüentenário: o que fazer com o produto do experimento econômico e social na ilha após o fim da União Soviética (1991).
Sem o "campo socialista", o regime optou por criar uma ilha comunista mutante, combinação de pregação socialista com a circulação de duas moedas. O modelo permitiu, a princípio, manter os gastos com saúde e educação, à diferença do ajuste chinês, mas não evitou a forte divisão na sociedade entre quem tem acesso à divisa forte e quem não tem.
Os sem moeda forte foram empurrados ao mundo ilegal e ao mercado negro. "Quando a sociedade cubana será uma sociedade mais reconhecível, na qual haja mais transparência e prestação de contas e as pessoas não precisem se engajar em atividades ilegais para sobreviver? Eu não sei, talvez em 20, 50 anos. É uma grande questão sociológica", diz Julia Sweig, especialista em Cuba do Council on Foreign Relations.
Os jovens, em geral, são os que mais reagem à situação com apatia política e cinismo. "É o mais triste para mim, a vitória em 1959 foi um júbilo nacional. Agora é só desesperança", conta, nostálgica, Marifeli Pérez-Stable, analista cubano-americana proibida pelo governo de pôr os pés na ilha.


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