São Paulo, domingo, 29 de fevereiro de 2004

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ELEIÇÃO NOS EUA

Pré-candidato ataca em público o sistema de financiamento de campanhas que ajuda a pagar suas despesas

Kerry critica poderosos, mas aceita doações

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

O pré-candidato democrata John Kerry defende a reforma do sistema de financiamento de campanhas eleitorais nos EUA desde que disputou um posto no Senado pela primeira vez (1984).
Contudo, segundo o recém-lançado livro "The Buying of the President, 2004" (a compra do presidente), de Charles Lewis, o homem que, várias vezes, criticou a influência dos Comitês de Ação Política sobre o sistema americano começou sua busca pela Presidência criando um CAP.
Em dezembro de 2001, Kerry criou duas entidades diferentes -um CAP federal e um comitê regional-, ambas chamadas Fundo para o Soldado Cidadão.
Vários políticos influentes, incluindo a maioria dos pré-candidatos à Presidência, são apoiados por comitês federais. Eles usam essas entidades para financiar suas viagens e para obter apoio político por meio da concessão de dinheiro a organizações políticas e a candidatos em todo o país.
Segundo Lewis, os fundos de Kerry levantaram, até seu fechamento, em 2002, cerca de US$ 1,35 milhão em "soft money" (verba que, em tese, vai para os partidos, não para a campanha dos candidatos). Entre os maiores doadores estão o advogado de Miami Milton Ferrell (US$ 59 mil) e John Manning, presidente do grupo Boston Capital (US$ 55 mil).
Embora, oficialmente, os comitês devessem ajudar candidatos em todo o país, dois terços do dinheiro distribuído pelos dois fundos foram concedidos a candidatos de poucos Estados, incluindo Iowa, New Hampshire e Carolina do Sul. Vale lembrar que a candidatura de Kerry só se consolidou depois que ele obteve ótimos resultados nas prévias dos três Estados, que estiveram entre os primeiros a realizar a votação.
"Kerry quer passar uma imagem que não condiz com suas ações. Não foi por acaso que ele usou boa parte do "soft money" que conseguiu arrecadar nos Estados que realizaram as primeiras prévias democratas. Ele sabia que era importante ter um bom começo para viabilizar sua candidatura", afirmou Lewis à Folha.
"Kerry não pára de criticar o "soft money", mas não deixou de utilizar as doações. Com isso, fica-se com a impressão de que ele ataca certos grupos de interesse, mas poderá privilegiar outros, como as grandes empresas de telecomunicações", acrescentou.
De fato, segundo o Centro por Integridade Política, que é presidido por Lewis e monitora disputas eleitorais nos EUA desde a década passada, Kerry recebeu, em seus 20 anos de campanhas, mais de US$ 232 mil do escritório de advocacia Mintz, Levin, Cohn, Ferris, Glovski & Popeo. Este trabalha em muitos casos ligados a empresas de telecomunicações.
Ademais, o conglomerado Time Warner é o terceiro maior doador a Kerry (mais de US$ 145 mil). Empresas de mídia já deram mais de US$ 300 mil ao democrata, segundo o "Boston Globe".
Apenas a Viacom gastou por volta de US$ 3,2 milhões nas campanhas eleitorais de 2000 e de 2002, sendo que 81% dessa soma foram destinados a democratas. "Não quero ver fantasmas onde eles não existem, mas Kerry votou a favor da desregulamentação da mídia em 1996", apontou Lewis.
O pré-candidato democrata argumenta que não mudou seu modo de pensar sobre o financiamento das campanhas nos EUA. Todavia diz que a abertura dos Fundos para o Soldado Cidadão foi necessária para fortalecer seu partido no Congresso.
"Só mudaremos o modo como as campanhas são financiadas quando tivermos uma boa maioria no Congresso. Precisamos usar todos os meios legais para ajudar candidatos democratas", afirmou Kerry no passado.
Segundo Lewis, George W. Bush e os republicanos são "mestres na arte de arrecadar dinheiro". "Em dez anos, Bush arrecadou cerca de US$ 300 milhões. É verdade que ele disputou a Presidência em 2000, porém seus números são impressionantes. E ainda não estamos falando de tudo o que ele arrecadará na atual campanha eleitoral", avaliou.



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