São Paulo, domingo, 29 de fevereiro de 2004

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Autor pretende expor contradição democrata

DA REDAÇÃO

O problema da maioria dos democratas é atacar grupos de interesse sem deixar de receber dinheiro desses grupos. John Kerry não pára de criticar as grandes corporações, mas não abriu mão de ser beneficiado por elas. Eis uma contradição dos democratas.
A análise é de Charles Lewis, fundador e editor-executivo do Centro por Integridade Pública, entidade que monitora campanhas eleitorais nos EUA, situada em Washington, e autor de "The Buying of the President, 2004", lançado em janeiro passado. Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha. (MSM)

 

Folha - Qual é sua intenção ao expor as contradições dos políticos no que tange ao financiamento de suas campanhas eleitorais?
Charles Lewis -
Trata-se da terceira vez em que escrevemos o mesmo tipo de livro. Seu nome foi inspirado em livros muito famosos nos EUA. O primeiro é, na verdade, uma série que foi publicada nas décadas de 60 e de 70. Seu nome é "The Making of the President" [a feitura do presidente], de Theodore White. Essa série expõe o modo como um candidato a presidente é feito, como sua campanha decola etc. Todavia não fala de seu financiamento.
O segundo livro chama-se "The Selling of the President, 1968" [a venda do presidente, 1968] e foi escrito por Joe McGinniss. Ele estuda o presidente Richard Nixon [1969-1974] e seu envolvimento com grupos de interesse. Sua capa mostra um maço de cigarros com o rosto de Nixon nele estampado. Ele debate a propaganda política e discute o modo como candidatos são comprados e vendidos, como quaisquer outros produtos.
Na década passada, percebemos que ninguém escrevia nada sobre os segredos sujos dos candidatos, sobre o modo como eles levantam dinheiro para suas campanhas. Decidimos, então, mostrar quem estava por trás dos grandes candidatos. Sabemos que os políticos não são ingênuos em nenhum lugar do planeta e queremos dar mais transparência ao processo político americano.
É muito importante que o eleitorado saiba quem dá quanto a quem, pois a retórica dos políticos todo mundo já conhece. É, portanto, crucial mostrar quem banca a candidatura de quem. Com o livro, buscamos afastar as "bobagens" da análise política, concentrando nossos esforços nos grandes financiadores dos políticos.

Folha - Desta vez, as contradições de Kerry são as mais importantes?
Lewis -
Os republicanos têm uma grande vantagem: não tentam esconder que recebem dinheiro de grandes corporações.
Recentemente, Kerry adotou a retórica de Howard Dean [pré-candidato democrata que já abandonou a campanha] contrária às grandes corporações. Assim, passou a atacar os interesses especiais, a oligarquia dos burocratas de Washington e suas relações com as empresas. Kerry roubou a retórica de Dean porque se trata de um discurso que é bem acolhido pelo eleitorado democrata.
Todos os políticos americanos estão envolvidos com grupos de interesse. A grande diferença entre [George W.] Bush e Kerry é que o primeiro arrecadou cinco vezes mais dinheiro que o segundo na metade do tempo. Em cerca de 20 anos de carreira, o senador democrata arrecadou por volta de US$ 60 milhões. Bush conseguiu levantar US$ 300 milhões.
Bush é menos hipócrita, visto que não vive atacando os grupos de interesse e as grandes corporações, enquanto Kerry não pára de falar do tema nos últimos meses. O problema da maioria dos democratas é atacar os grupos de interesse sem deixar de receber dinheiro desses grupos. Eis uma contradição típica do partido.



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