São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 2005

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DIREITOS HUMANOS

Mukhtar Mai foi estuprada por 13 homens por determinação de conselho tribal, que queria punir seu irmão

Justiça do Paquistão reverte absolvição de estupradores

DA REDAÇÃO

A Corte Suprema do Paquistão determinou ontem que 13 acusados de estuprar uma mulher por determinação de um conselho tribal sejam presos. A decisão marca uma reviravolta em um caso emblemático depois que a vítima, Mukhtar Mai, apelou, na véspera, da absolvição dos acusados por uma instância inferior.
Mai, 33, virou símbolo internacional da luta pelos direitos femininos em países onde a chamada "lei da honra" e a justiça tribal ainda vigoram, e casos como o seu não são únicos. Ela sofreu um estupro coletivo em 2002 por determinação do conselho do povoado de Meerwala, no sul da Província do Punjab, que ordenou o ato em punição a seu irmão.
O adolescente, na época com 12 anos, é acusado de relacionar-se com uma mulher de casta superior, pertencente a uma poderosa família local. A família Mai nega o caso e diz que se tratou de um esquema para encobrir o seqüestro e a sodomia do menino por membros da família rival.
Em março, uma corte inferior absolvera cinco dos acusados, alegando falta de provas, e comutara a pena capital de um sexto, substituindo-a por prisão perpétua. Os demais -quase todos membros do conselho que ordenou o estupro coletivo- haviam sido absolvidos três anos antes.
Todos os acusados estão na cadeia desde que Mai solicitou sua prisão após a absolvição, alegando sentir-se ameaçada. Mas nenhum fora formalmente indiciado até agora (a lei paquistanesa permite a detenção sem indiciamento por até três meses).
Nova audiência será marcada para a divulgação da sentença.
Dezenas de mulheres que aguardavam a decisão do lado de fora da Corte Suprema abraçaram e cumprimentaram Mai na saída. "Estou feliz e espero que aqueles que me humilharam sejam punidos. Eu esperava que a Suprema Corte fizesse justiça, e isso aconteceu", declarou ela na saída.

Passaporte confiscado
O caso de Mai criou comoção internacional por sua decisão de confrontar os agressores -algo raro em situações semelhantes.
"Eu tinha três opções: pular num poço e me matar, chorar minha vida inteira como outras vítimas ou desafiar um sistema tribal, cruel e feudal", declarou ela em entrevista à revista "Christian Science Monitor".
O caso também expôs a fragilidade e o anacronismo da Justiça do Paquistão, um dos principais aliados dos EUA na Ásia. Apesar de o ditador Pervez Musharraf ter afirmado que o que aconteceu com Mai "não é representativo", o país teve 350 casos de estupro coletivo registrados nos primeiros nove meses de 2004 (último dado disponível). A maior parte dos casos não chega a ser notificada.
Antes de chegar à Suprema Corte, o processo já havia passado por outros tribunais locais, provinciais e religiosos, que emitiam veredictos díspares sob alegações mais divergentes ainda.
Em meio às controvérsias, Musharraf proibiu Mai de viajar para o exterior e limitou seu trânsito no país -seu passaporte foi confiscado e ela teve de recusar convites para palestras de organizações estrangeiras de direitos humanos.
O governo só recuou após críticas explícitas do presidente dos EUA, George W. Bush. Anteontem, o passaporte foi devolvido.


Com agências internacionais

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