São Paulo, domingo, 29 de junho de 2008

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À frente da UE, Sarkozy busca sintonia com cidadãos

França assume presidência rotativa do bloco priorizando imigração e ambiente

Mas agenda de Paris ignora a maior preocupação dos europeus hoje, a inflação; impasse com Tratado de Lisboa pode fortalecer país

SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL

O francês Nicolas Sarkozy assume nesta terça-feira a presidência rotativa da União Européia (UE) prometendo cumprir até janeiro uma agenda pragmática sintonizada com as "verdadeiras" preocupações dos cidadãos do bloco.
Mesmo tomando as rédeas da UE em meio à ressaca causada pela recente rejeição dos irlandeses ao Tratado de Lisboa, que freia o fortalecimento institucional do bloco, o presidente francês aposta em avanços.
Imigração, proteção ambiental, energia e defesa comum são as prioridades ostensivamente enumeradas por Sarkozy.
A agenda da presidência francesa está em boa parte alinhada com o que querem os europeus, de acordo com a última pesquisa do Eurobarômetro -realizada a cada semestre pela Comissão Européia.
Segundo o levantamento, divulgado na semana passada, 62% dos cidadãos do bloco consideram as mudanças climáticas o maior problema do planeta. A França pretende responder com um acordo que prevê a redução de 20% das emissões poluentes na UE até 2020.
O estudo também revela que dois terços dos europeus acham que defesa e segurança do continente deveriam ser prerrogativas da UE, não dos governos nacionais. Antecipando-se ao resultado do documento, Paris já vinha manobrando para reforçar o núcleo militar do bloco, hoje modesto.
Outro projeto da presidência francesa é um "pacto de imigração", destinado a harmonizar -e endurecer- as leis dos 27 países-membros sobre asilo e expulsão de ilegais. Os contornos da nova lei migratória do bloco, contestada com vigor pela América Latina, já foram aprovados pelo Parlamento da UE. Um em cada dez europeus vê na imigração o maior problema enfrentado no continente.
"Há uma crescente demanda popular pela "europeização" das instituições, inclusive em áreas estratégicas como defesa e imigração", diz o cientista político Dominique Reynié, autor do relatório "Opinião Européia", publicado anualmente desde 1999. Ele atribui razões pragmáticas, não ideológicas, a esse apego a uma UE mais forte: "Os europeus perceberam que, em um mundo vasto e globalizado, seus pequenos países não terão chance se ficarem isolados".
Entretanto, a agenda de Sarkozy pouco fala daquele que os europeus realmente consideram como o principal problema do bloco: a economia. O poder de compra está no topo (37%) da lista dos 11 maiores desafios do bloco, à frente do desemprego (24%) e da segurança (17%).
"As principais demandas envolvem questões econômicas e sociais, em grande parte ligadas à inflação, e isso alimenta crescentes protestos", diz Pascal Delwit, reitor da faculdade de Ciências Políticas da Universidade Livre de Bruxelas.
A França fala até em reformar a Política Agrícola Comum (PAC), pilar do Orçamento da UE, e em diversificar a matriz energética para reduzir a dependência do petróleo, cuja alta alavanca a inflação. Mas é consenso que as duas metas não podem ser alcançadas num prazo de seis meses.

Regras comuns
Após uma série de presidências européias norteadas por preocupações burocráticas ligadas à ampliação do bloco, a França aposta na chance de imprimir sua marca com uma gestão mais ousada. Mas antes disso, Paris deverá se preocupar com o futuro do Tratado de Lisboa -conjunto de regras que só pode vigorar se ratificado por todos os países-membros.
Juridicamente, as prioridades francesas não sofrerão tanto os efeitos da rejeição do tratado, e o bloco só deve decidir em outubro que medidas tomar para reverter o rechaço ao texto na Irlanda. Mas caberá à França coordenar a ratificação nos oito países que ainda não votaram e dissipar o desânimo que se abateu sobre o futuro da UE como entidade coesa. Um desafio externo que Sarkozy espera usar para reverter sua alta rejeição dentro da França.
"Sarkozy tem vários projetos políticos ambiciosos, mas, se ele conseguir levar adiante a ratificação do tratado, sua presidência já será coroada de sucesso", aposta Reynié.
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