São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

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Pacifista israelense quer virar soldado

MARCELO STAROBINAS
DA REDAÇÃO

A história de Hagai Dekel, 29, sintetiza a transformação por que passou a sociedade israelense ao longo dos dois anos de Intifada.
Pacifista, identificava-se com as idéias simpáticas à causa palestina da extrema esquerda do espectro político do país. Crítico da ocupação, foi dispensado pelo Exército de atuar como reservista.
"Eles me livraram do "miluim" (serviço de reservista) porque eu dizia que não pegaria em armas de jeito nenhum", contou à Folha Dekel, que trabalha no departamento de informações do aeroporto Ben Gurion, de Tel Aviv.
A desilusão com a liderança palestina e a irritação com os atentados suicidas mudaram radicalmente o seu ponto de vista. "Entendi que ser pacifista seria possível se eu vivesse na Noruega ou no Brasil", contou. "Não é possível fazer a paz com os palestinos. Nem nessa geração nem na próxima. O ódio é muito grande."
Decidiu, então, voltar à repartição militar. Ofereceu-se como voluntário para combater os palestinos. Foi rejeitado. "Não me aceitaram de volta no Exército. Acham que sou louco. Não acreditaram na minha sinceridade, não entendem como um dia eu era pacifista e agora quero lutar."
Num país de pequenas dimensões geográficas e populacionais (6,5 milhões de habitantes) como Israel, a ameaça terrorista parece estar sempre próxima. A advogada Shelley Dvir, 26, vive no centro de Tel Aviv. Há duas semanas, pegou o ônibus número 4 por volta do meio-dia. Uma hora mais tarde, um homem-bomba se explodiu dentro dele, matando seis pessoas na rua Allenby. "Além disso, já atacaram um café aqui perto de casa, outro ônibus que costumo pegar, o shopping center que frequento (Dizengoff Center) e a discoteca que eu costumava ir (Dolphinarium)", afirmou.
Os israelenses tiveram de adaptar seus hábitos às ameaças da Intifada. Aqueles que continuam a frequentar bares e restaurantes -cuja clientela foi dizimada- escolhem as mesas do fundo, longe da entrada e das janelas, onde geralmente ocorrem as explosões.
Há seguranças em todos os locais públicos. E filas nas portas, para que todas as bolsas sejam revistadas. "No Dizengoff Center, além de verificarem todas as mochilas, agora exigem a carteira de identidade para poder entrar", observou Dvir. "Vi muitas pessoas indo embora porque não haviam trazido documentos."
Ela continua a sair -"a vida continua"- apesar de regras de sobrevivência pouco ortodoxas: "Acho mais seguro ir aos lugares que já foram bombardeados, já que as chances de atacarem duas vezes o mesmo local é pequena".
Na véspera do Ano Novo judaico, enquanto muitos apresentavam votos de saúde, dinheiro e alegria, o ex-pacifista Hagai Dekel expressava um amargo realismo: "Desejei às pessoas que elas e seus familiares continuassem vivos no novo ano. Só isso já basta".



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