São Paulo, quinta-feira, 29 de outubro de 2009

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Diplomacia presidencial do Brasil é vital para a região, dizem analistas

Para especialistas, diversidade política e assimetrias econômicas impõem papel de coordenação ao Brasil

CLAUDIA ANTUNES
ENVIADA ESPECIAL A CAXAMBU (MG)

A diversidade de sistemas políticos e as assimetrias econômicas na América do Sul aumentam a importância da diplomacia presidencial brasileira para a gerência de conflitos na região, de natureza econômico-comercial ou política.
Isso representará um desafio para o presidente eleito em 2010, depois de 16 anos em que os ocupantes do Planalto -Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva- se sentiam à vontade em tomar a frente de iniciativas regionais.
Esse foi um dos pontos ressaltados no painel sobre integração sul-americana realizado ontem no encontro anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), em Caxambu (MG).
"A fragmentação política cria demanda por liderança, e Lula tem cumprido esse papel. Um presidente mais retraído não responde tão bem", disse Alcides Vaz, da UnB. Maria Regina Soares de Lima, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio), lembrou que a vantagem da diplomacia presidencial é "excluir os elementos mais corporativos da política externa", favorecendo a resolução de disputas.
Vaz, Lima e mais dois especialistas traçaram panorama da integração regional que pode ser visto como um copo meio cheio ou meio vazio e destacaram duas fases: uma que vai de meados dos anos 80, quando foi criado o Mercosul, até 1997, e outra desde então.
Na primeira, coincidente com a redemocratização dos países que passaram por ditaduras militares, havia relativa homogeneidade política e econômica. Na segunda, a partir da crise asiática, houve alternância de forças no poder em 7 dos 12 países e projetos econômicos divergentes.
Ao mesmo tempo, se aprofundou a tendência regional de diversificação das parcerias comerciais, com os Estados Unidos permanecendo importantes e o aumento das trocas com a China. "Essa diversidade é complexa quando se pensa numa integração segundo o modelo da União Europeia. Mas integração "light" não é problema", disse Lima.
Ela propôs que a posição do Brasil, que responde por 50% da economia sul-americana e dirige cerca de 20% de suas exportações à região, seja pensada não como de liderança clássica, mas como um "exercício de tarefas de coordenação", com uma estratégia diferente para cada problema.
"Pode-se pensar o caso do Banco do Sul, em que a proposta venezuelana foi moldada a interesses brasileiros, como um exercício de liderança coercitiva, enquanto o Conselho Sul-Americano de Defesa seria uma tentativa de liderança intelectual", afirmou.
Maria Celina D'Araujo, da PUC-RJ, questionou se a liderança brasileira seria de fato uma necessidade ou um "mantra que se repete de forma pouco crítica", relegando a segundo plano problemas internos graves na área social.
Os outros debatedores concordaram que antigas ambições sobre projetos de integração na América do Sul -como o próprio Mercosul ou a IIRSA, iniciativa de conexão da infraestrutura regional lançada em 2000- acabaram sendo revistas. Mas disseram que, paradoxalmente, são os vizinhos que cobram hoje do Brasil um papel mais ativo.
"A exigência em relação ao Brasil é que ele se torne o "paymaster" [fiador] da região. Há reconhecimento da hegemonia, ainda que sob a forma de "luta contra o imperialismo" em países como Bolívia ou Paraguai", disse Tullo Vigevani, da Unesp.
Ele lembrou das resistências no Brasil a pagar pelo custo da liderança. "As elites têm dúvidas sobre a integração", disse. "A questão", emendou Lima, "é que estamos dentro da região. Não podemos sair fora, colocar o Brasil na Europa".


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