São Paulo, domingo, 29 de novembro de 2009

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Cúpula evita dizer "sim" ou "não" à Honduras

Para encontro de grupo Ibero-Americano, o anfitrião, Portugal, avalia emitir nota que não exponha o racha na região

A intenção é afirmar que eleição é parte de processo mais amplo e que não seria conveniente invalidá-lo, tampouco sacramentá-lo


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA

O governo português, anfitrião da Cúpula Ibero-Americana que começa hoje à noite, está avaliando a viabilidade de emitir uma declaração da presidência sobre a crise em Honduras, que não estava na agenda original do encontro mas inevitavelmente se tornou ponto central, na medida em que os governantes começam a deliberar no dia seguinte à polêmica eleição presidencial hondurenha.
Tornar o tema assunto de uma declaração à parte -e emitida pela presidência, não pelo conjunto de países ibero-americanos- é a única maneira possível de se evitar a exposição pública do racha nas Américas em torno de Honduras.
Os organizadores do encontro não acreditam que o Brasil, historicamente reconhecido por uma diplomacia mais sutil e menos agressiva, force um documento que exponha as divisões. Mas suspeitam que a Argentina possa fazê-lo, por estar se revelando a mais radical nas discussões prévias.
A Venezuela, que usualmente desempenha esse papel, aparentemente não terá sua delegação chefiada pelo presidente Hugo Chávez, o que reduz em incontáveis decibéis o volume do ruído. De quebra, se não vier mesmo, elimina a possibilidade de um confronto direto com o colombiano Álvaro Uribe.
Outra ausência "bolivariana" certa é a do presidente boliviano Evo Morales, que assim como o uruguaio Tabaré Vázquez permanecerá em casa.
A contabilidade preliminar sobre Honduras indica maioria favorável à não aceitação da eleição de hoje, caso em que se incluem pelo menos todos os quatro do Mercosul, todos os oito "bolivarianos" -menos Honduras, claro- e a Guatemala. Mas Peru, Panamá e Costa Rica já declararam aceitar o resultado com argumentos que vão além de discutir a legitimidade ou não de eleições conduzidas por um governo de facto.
"Para que vamos castigá-los [aos hondurenhos] com um segundo furacão Mitch, que é o que ocorreria se isolarmos o novo governo?", diz Óscar Arias, presidente costa-riquenho e autor de proposta de conciliação aceita pelas partes mas que não foi implementada.
Reforça José García Belaúnde, o chanceler do Peru: "Todos os países da América Latina saíram de ditaduras por meio de processos eleitorais conduzidos por governos que não eram democráticos".

No meio do caminho
A divisão levou o governo português a trabalhar com a hipótese de adotar o espírito da posição que a União Europeia está por encampar: afirmar que o processo eleitoral é apenas parte de um processo mais amplo, com o que não seria conveniente nem invalidá-lo nem sacramentá-lo.
Reconhecer ou não o resultado dependeria de se reconduzir o presidente Manuel Zelaya ao cargo, tal como estava previsto na proposta de Óscar Arias, mas que o Congresso hondurenho não referendou até agora.
A expectativa não declarada é a de que, dependendo da maneira como se desenvolver a eleição e do comparecimento, o Congresso finalmente aprove, no dia 2, a volta de Zelaya.
Marco Aurélio Garcia, assessor diplomático do presidente Lula, que participa da cúpula apenas na segunda e na terça, não do jantar inaugural de hoje, disse à Folha que tinha a informação de que o próprio Zelaya aceitaria o pleito se o comparecimento às urnas fosse de ao menos 80%. É óbvio que essa porcentagem não será atingida, mas é uma indicação clara de como a maneira como se desenrolará a votação terá peso para a sua aceitação ou não pelos demais países.


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