ADAM LE BOR
do "The Independent"

É uma viagem no tempo, de volta à época em que ditadores comunistas governavam metade da Europa, acumulando bens de luxo de maneira decididamente anti-socialista, enquanto seus compatriotas passavam horas em filas intermináveis para comprar os produtos indispensáveis a sua sobrevivência diária.
Os mais vorazes de todos eram Nicolae Ceaucescu e sua gananciosa mulher, Elena, o rei e a rainha do mau gosto nos Bálcãs. Agora, qualquer pessoa que anseie por um terno de poliéster marrom, estilo Ceaucescu, ou um par de sapatos brancos reluzentes, sem falar num carro esporte ou iate de luxo, já tem como andar por aí no legítimo estilo "ditador dos anos 70".
Nove anos depois de "o gênio dos Cárpatos", como Ceaucescu se descrevia, e sua mulher serem mortos por uma saraivada de balas, no dia de Natal, 1989, as pilhas de bens do casal serão leiloadas pela Internet.
O Web site www.ceaucescu. ines.rom é um misto singularmente comunista de ostentação e kitsch. Suas páginas e páginas de carros, embarcações, roupas e residências oferecem um vislumbre do estilo de vida levado pelo casal governante que, durante décadas, submeteu a Romênia a um reinado de terror. Como quase todas as ditaduras comunistas, o casal Ceaucescu denunciava o capitalismo ao mesmo tempo em que agarrava para si o máximo possível de seus frutos.
O site oferece imagens de algumas partes do enorme guarda-roupas do casal. Estantes de casacos de pele brigam por espaço com outras estantes de "tailleurs" femininos, em tons gritantes de cor-de-rosa, amarelo e azul turquesa. A coleção de sapatos de Ceaucescu é de provocar inveja a Imelda Marcos. Um dos itens que mais chama a atenção é um par de sapatos de couro branco perfeitos para algum cafetão nova-iorquino.
Os bens do casal Ceaucescu foram desapropriados pelo governo romeno e são administrados pela Administração do Protocolo Estatal (APE). Estão guardados em depósitos do governo desde a revolução de 1989, o mais sangrento dos levantes que derrubaram os regimes do bloco soviético. Ceaucescu sobe ao poder em 1967, implantando um regime cuja polícia política, a Securitate, implanta uma violenta repressão a opositores.
Na década de 80, com a política de abertura que se implanta na URSS, o ditador romeno se vê cada vez mais isolado enquanto assiste a uma crescente crise econômica.
Em dezembro de 1989, a Securitate abre fogo contra um protesto, matando centenas de pessoas. Estoura uma insurreição popular que acaba com a morte do ditador e de sua mulher.
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Suvenir ditatorial "Estamos recebendo uma enxurrada de e-mails de pessoas interessadas no leilão. Algumas são colecionadoras especializadas, mas muita gente apenas quer possuir alguma coisa que pertencia ao casal Ceaucescu", disse Mihai Nica, da APE, em Bucareste.
O Web site oferece aos potenciais compradores a chance de olhar os produtos à venda com calma. Um tour completo pelo site leva mais de uma hora. O leilão está programado para o início de 1999, em local a ser definido. Os lucros serão injetados no Orçamento nacional.
Mas a impressão que se tem é que as autoridades romenas ainda não compreenderam o capitalismo muito bem. Elas esperam que o leilão renda pelo menos US$ 1 milhão, mas, a julgar pela lista enorme de itens que serão postos à venda, essa estimativa parece ser muito baixa. Comparados com outros ditadores, como o xá do Irã, Nicolae e Elena Ceaucescu eram sibaritas menores. Mas, num país comunista no qual o maior sonho do cidadão médio era chegar a ser dono de um Lada, eles pareciam viver em outra galáxia.
Entre os automóveis que irão a leilão figuram um Buick Elektra 1975 oferecido a Ceaucescu por Richard Nixon, num lembrete constrangedor de como o Ocidente tinha por hábito recompensar o ditador por sua política externa independente e sua ocasional recusa em obedecer as ordens de Moscou, um Mercedes 350 SL fabricado especialmente para a filha do casal, Zoe, e um Dacia 1100, o primeiro carro produzido na Romênia.
Há dois barcos-residências de luxo, os Snagov I e II, diversas lanchas e um depósito inteiro de objetos domésticos de gosto duvidoso, tais como estantes de vasos, abajures e elefantes esculpidos em marfim. Muitos desses objetos parecem ter sido presentes de dirigentes estrangeiros. Talvez se encontrem em alguma parte da coleção os artigos que teriam desaparecido do Palácio de Buckingham após a estadia do casal Ceaucescu ali durante sua visita de Estado ao Reino Unido, em 1978.
Por trás das pilhas de objetos kitsch há uma questão séria, segundo as autoridades romenas. Os bens foram expostos para tentar acabar com a aura de mistério que ainda cerca a era Ceaucescu. "Estamos divulgando tudo isto na Internet porque tudo, durante o governo Ceaucescu, era mantido em tão grande sigilo", disse Nica. "Agora estamos nos propondo a mostrar tudo a quem quiser ver. Precisamos andar para a frente e desmistificar o que ficou para trás."
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