São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

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Tropas da Etiópia chegam à capital somali

Mogadício, que estava sob o controle das milícias islâmicas, é ocupada pelas forças do governo provisório da Somália

Governo é fraco e pode ser refém de líderes tribais que preencheram o vazio criado há 15 anos pelo colapso do Estado; capital é saqueada

DA REDAÇÃO

Apoiados pelo Exército etíope, combatentes leais ao fraco governo provisório da Somália se apoderaram ontem de Mogadício, capital daquele esfacelado país africano.
As milícias islâmicas, que mantinham há sete meses o controle da cidade, retiraram-se sem maior resistência. Sua derrota satisfaz os Estados Unidos, que acreditam haver ligações entre elas e a Al Qaeda.
O primeiro-ministro etíope, Meles Zenawi, afirmou que, nos dez últimos dias de operações, entre 2.000 e 3.000 milicianos islâmicos foram mortos. Não há como confirmar a cifra.
O jornal "Financial Times" diz que o fim do controle de Mogadício pelo Conselho dos Tribunais Islâmicos da Somália, nome desse conglomerado de grupos, pode abrir um período de incertezas, com a forte possibilidade de alguns chefes tribais voltarem a se enfrentar. Eles atuavam oportunisticamente sob o comando islâmico e agora podem relançar a antiga e intermitente guerra civil.
"Fomos derrotados", disse à Reuters um dos milicianos, já em roupas civis para, a exemplo de centenas de outros combatentes, não sofrer represálias dos novos ocupantes.
Um dos chefes militares islâmicos, Abdirahman Janaqow, disse que seu objetivo era o de evitar "um banho de sangue" na capital. Afirmou que enfrentaria em campo aberto as forças etíopes, "para não comprometer a população civil".

Recuo tático
Pela manhã, o chefe do fraco governo provisório, Mohamed Ali Gedi, anunciou a chefes tribais aliados que a queda da capital era apenas uma questão de horas. Naquele momento as lideranças islâmicas deixavam a cidade, numa operação desordenada que qualificaram de "recuo tático". Lojas e mercados passaram a ser imediatamente saqueados, informa a Associated Press.
O premiê etíope, homem forte do episódio, disse que não permitiria que Mogadício mergulhasse no caos.
O presidente do governo interino, Abdullahi Yiusuf, afirmou que suas tropas não eram uma "ameaça à população da capital" e fez um apelo para que se pacifique o país "por meio do diálogo". Ele e o premiê Gedi nunca despacharam da cidade. Têm seus gabinetes em Baidoa, a 200 km de distância.
Mohamed Jama Furuh, um chefe de clã com suas próprias milícias, anunciou a captura do porto marítimo de Mogadício. Um dos combatentes islâmicos, Yusuf Ibrahim, admitiu que outro porto, o de Kismayo, corria o risco de ser também tomado em seguida.
A Associated Press, citando relatório oficioso de um observador da ONU, diz que em Kismayo os islâmicos passaram a recrutar até garotos de 12 anos.
O Estado somali entrou em colapso em 1991, após a deposição do ditador pró-soviético Siad Barre. O vácuo de poder foi preenchido por chefes tribais, que se enfrentavam uns aos outros e vendiam proteção, em troca de impostos e recrutamento de "voluntários".
A pirataria se tornou uma das fontes de renda dessas milícias, com o ataque a embarcações que navegavam pelo litoral do Chifre da África -o extremo nordeste do continente.
Foi nessa situação caótica que surgiram os tribunais islâmicos, baseados no poder militar e na rede de mesquitas, que assumiu as funções do inexistente Judiciário e assegurou parte dos serviços públicos.
Mas os tribunais se aliaram a grupos islâmicos radicais de fora da Somália, acusando a Etiópia, país com forte população cristã, de promover uma "cruzada". Os tribunais também eram apoiados pela Eritréia, inimiga do governo etíope, o que amplia a internacionalização do conflito.
O site de um grupo islâmico iraquiano próximo à Al Qaeda lançou nesta semana um apelo para que voluntários se incorporem à "guerra santa" somali.


Com agências internacionais


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