São Paulo, sexta-feira, 30 de janeiro de 2004

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REINO UNIDO

Maioria dos britânicos acha injusto relatório sobre a morte do cientista David Kelly; diretor-geral da emissora se demite

Para 56%, juiz foi duro demais com a BBC

DA REDAÇÃO

A conclusão do inquérito sobre a morte do cientista britânico David Kelly provocou ontem mais uma baixa na rede estatal de rádio e TV BBC -com a saída de seu diretor-geral-, mas não pôs fim à polêmica sobre os motivos que levaram o Reino Unido a participar da Guerra do Iraque.
O relatório judicial do lorde Hutton, divulgado anteontem, foi recebido com desconfiança pela população, que acha que ele foi duro demais com a BBC, e criticado pela mídia.
Segundo pesquisa de opinião do jornal londrino "Evening Standard", 56% dos entrevistados acham que o relatório do juiz não foi justo e 70% pediram uma investigação independente dos motivos que levaram o país a se aliar aos EUA contra o Iraque.
Ontem, jornais e tablóides britânicos criticaram Hutton por ter "sufocado o caso em proveito do establishment político". "Os jornalistas da BBC devem seguir investigando, fazendo perguntas incômodas e criando problemas", disse editorial do "Guardian".
Já o "Daily Express" afirmou que "o abafamento do caso pelo juiz Hutton deixa perguntas sem respostas". Outro jornal publicou uma foto de Blair em sua primeira página, com o título "São Tony".
Anteontem, Hutton, da Suprema Corte, exonerou o premiê Tony Blair de responsabilidade na morte do microbiologista David Kelly. O assessor do governo na área de armas químicas e biológicas suicidou-se em julho passado após ter sido nomeado como fonte de uma reportagem da BBC que criticava o governo por seu dossiê sobre o Iraque.
O juiz disse ser infundada a alegação da BBC de que o governo britânico teria inflado seu relatório de inteligência sobre a ameaça representada pelas armas de destruição em massa iraquianas.
O premiê Tony Blair justificou sua decisão de participar da Guerra do Iraque com o argumento de que o regime do ditador Saddam Hussein representava um sério perigo à segurança internacional. Para convencer a população, ele divulgou um dossiê sobre o suposto arsenal de armas de destruição em massa iraquiano.
Nove meses após a queda de Saddam, não foram encontradas armas de destruição em massa no país. Sabe-se que o Iraque as utilizou contra o Irã e inimigos do regime na década de 80, mas elas foram parcialmente destruídas pela ONU nos anos 90, após a Guerra do Golfo (1991), e é possível que o Iraque tenha eliminado o que restava. Entretanto o regime de Saddam nunca provou isso.
Um dia após o presidente da BBC, Gavyn Davies, se demitir, ontem foi a vez de o diretor-geral, Greg Dyke, deixar seu cargo.
Já o presidente interino da BBC, Richard Ryder, apresentou "desculpas sem reservas" ao governo. O premiê Tony Blair -que havia prometido renunciar caso o juiz Hutton o responsabilizasse no episódio- tentou colocar um ponto final à questão.
"Para mim, isso sempre foi, simplesmente, questão de uma acusação muito séria que havia sido feita. Agora, ela foi retirada, e é tudo o que eu queria. Isso nos permite encerrar o assunto e seguir adiante", disse Blair.
Em frente à sede da BBC, em Londres, funcionários protestaram. A BBC, com 82 anos de história, é motivo de orgulho para os britânicos e referência em termos de jornalismo em todo o mundo.
Ontem, não havia nenhuma informação sobre o destino do jornalista Andrew Gilligan, autor da polêmica reportagem, de maio de 2003, sobre o dossiê iraquiano.


Com agências internacionais

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