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ORIENTE MÉDIO
Território vê proliferação de grupos armados ligados às diferentes facções; divisão aparece até na vida acadêmica
Gaza troca ação anti-Israel por caos interno
MICHEL GAWENDO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM TEL AVIV
Até setembro do ano passado,
os grupos armados da faixa de
Gaza lutavam contra a ocupação
militar de Israel. Mas depois que
os colonos e tropas foram retirados e da vitória eleitoral do Hamas, as milícias passaram a lutar
entre si, em conflitos que envolvem política, religião, rixas entre
famílias, honra pessoal, corrupção e contrabando de armas e
drogas. Em vez de Intifada, o levante contra a ocupação, os palestinos falam agora em fauda (caos)
e fitna (guerra civil).
De um lado estão a polícia oficial palestina (conhecida como os
"guardas azuis") e grupos ligados
ao Fatah, do presidente Mahmoud Abbas, que tenta reter um
pouco do poder perdido na eleição. São cerca de 60.000 homens
com salários atrasados.
Do outro, o Hamas, do premiê
Ismail Haniya, e seus aliados radicais islâmicos, que reúnem cerca
de 10 mil membros de grupos terroristas com disposição de fanatismo religioso e nacionalista.
Os conflitos já deixaram pelo
menos 40 feridos. E novos grupos
estão aparecendo, aderindo a algum dos lados. Em geral, são formados por chamulas (clãs) com
acesso a armas contrabandeadas
através de túneis na fronteira com
o Egito, ou desviadas da polícia.
"Praticamente cada um dos
grandes clãs tem uma força armada. O Hamas foi eleito com uma
agenda para controlar este caos,
mas não tem como fazer isso",
disse Shalom Harari, brigadeiro-general da reserva do serviço de
Inteligência do Exército de Israel,
que foi conselheiro de assuntos
árabes em diversos governos israelenses.
Com a falta de comando, essas
milícias acabam servindo para resolver problemas familiares. "O
ambiente de caos é perfeito para o
acerto de contas entre pessoas.
Uma dívida antiga, uma disputa
por um terreno, ou mesmo uma
paquera vira motivo para matar",
diz Bassem Eid, dirigente do Grupo Palestino de Monitoramento
de Direitos Humanos.
Somente na semana passada,
dois novos grupos foram anunciados: as Brigadas Yasser Arafat,
ligadas ao Fatah, e uma facção dos
Comitês de Resistência Popular,
que desfilou com cerca de 50 homens mascarados em de Gaza e
anunciou apoio ao Hamas.
Em Gaza há cerca de 60 mil armas oficiais e outras 60 mil ilegais,
nas mãos de grupos desse tipo, estimam as organizações de direitos
humanos. Na prática, nem Abbas,
nem Haniya têm o "falatam", expressão árabe para controle militar, essencial para se governar.
Cada milícia defende seus próprios interesses. Por exemplo,
membros do Fatah invadiram diversos escritórios do governo para exigir salários e foram confrontados por guardas das Brigadas
Izzedin al-Qassam, do Hamas. A
população aplaudiu a atitude dos
islamistas, vistos como um foco
de honestidade em contrapeso à
corrupção da OLP.
Dirigentes palestinos afirmam
que autoridades do Fatah perderam fontes de corrupção com a
chegada do Hamas ao poder. Armas, drogas, cigarros e produtos
eletrônicos são contrabandeados
para Gaza pela fronteira com o
Egito, ou por túneis. As antigas
autoridades do Fatah eram acusadas de receber suborno para fazer
vista grossa.
Na cidade de Gaza, a divisão
também aparece na vida acadêmica. Enquanto a Universidade
Islâmica é uma fortaleza do Hamas, a Universidade Al Azar é o
reduto do Fatah, com bandeiras
amarelas das Brigadas de Mártires de Al Aqsa penduradas nos
postes ao redor do pátio central.
Os prédios das duas instituições
ficam frente a frente, separadas
por um jardim bem cuidado no
centro da cidade. Os alunos se enfrentam a pedradas.
A guerra de palavras está ficando pior. O líder político do Hamas, Khaled Meshaal, que mora
em Damasco, capital da Síria,
acusou Abbas de tentar dar um
golpe para derrubar o Hamas e
chamou os membros do Fatah de
"mercenários miseráveis". Abbas
respondeu que Meshaal está incentivando uma guerra civil.
Os conflitos em Gaza começaram depois que Abbas vetou o nome do Hamas para o comando
militar no território de 3,5 milhões de habitantes. O homem indicado, AbuSamhadanah, é um
terrorista procurado por Israel.
Mas a divisão entre a OLP, de
onde surgiu o Fatah, que tem
orientação secular, e os grupos islâmicos começou bem antes: depois da Guerra dos 6 dias, em
1967, quando a faixa de Gaza e a
Cisjordânia foram capturadas por
Israel. Nesta última eleição, o conflito cristalizou-se.
"Não vejo sinais de melhora e há
muita tensão. Não se pode negar
que há uma forte possibilidade de
guerra civil", afirma o ativista dos
direitos humanos Eid.
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