São Paulo, segunda-feira, 30 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

QUESTÃO DE HÁBITO

Gigantes como McDonald"s e PepsiCo se movimentam para evitar ter de pagar indenizações a obesos

Redes de fast food temem processo nos EUA

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Em julho último, quando o supervisor comercial Caesar Barber, 56, moveu seus 123 quilos até o tribunal federal do Brooklyn, em Nova York, para processar quatro das maiores redes de fast food dos EUA sob a acusação de que elas teriam contribuído para que ele engordasse, muita gente riu.
Muita gente, menos os executivos e os acionistas dessas e de outras empresas de fast food do país, que movimentam US$ 107 bilhões por ano. Eles temiam que o processo pudesse ser o primeiro de uma série e que o setor pudesse tomar o lugar da indústria do tabaco na berlinda dos milionários processos de saúde.
A ação do nova-iorquino obeso continua em andamento, e os maiores e mais caros advogados de Manhattan, contratados a peso de ouro pelas quatro grandes para a defesa, recusam-se, por motivos óbvios, a dizer se outras ações do tipo se seguiram àquela. Sabe-se que já há escritórios de advocacia juntando grupos de clientes para novos processos.
Desde então, as empresas do setor vêm tomando discretamente medidas cujo objetivo final é um só: tornar o hambúrguer, a pizza e os refrigerantes que são consumidos em seus restaurantes mais saudáveis ou, ao menos, menos prejudiciais à saúde.
No final do ano passado, o Ministério da Saúde americano chocou a opinião pública com um relatório dizendo que o excesso de peso tomara proporções epidêmicas no país, com 69 milhões de pessoas acima do peso e 51 milhões de obesos, numa população total de 281 milhões.
Na movimentação dos gigantes do principal setor alimentício norte-americano vale tudo, de projetos de avisos do tipo "o Ministério da Saúde adverte" até mudanças nos óleos utilizados na fritura, passando pela busca do direito de usar o selo "saudável" nos produtos comercializados.
O McDonald's, citado no processo de Barber, já se mexeu. No início do mês, anunciou que vai passar a fritar suas batatas, os Chicken McNuggets e os sanduíches de frango e de peixe num novo óleo, que reduz os ácidos graxos em 48% e a gordura saturada em 16% -componentes que ajudam a aumentar o colesterol.
A PepsiCo deu o segundo passo. Na semana passada, a empresa, que, além dos refrigerantes, produz salgadinhos como o Doritos e o Cheetos, associou-se a um renomado centro de nutrição e esportes de Dallas, que vai dar seu selo de "saudável" a uma nova linha de salgadinhos e refrigerantes a ser criada pela empresa.
Trata-se do Cooper Aerobics Center, de Kenneth Cooper, que também vai desenvolver para a empresa dicas de exercícios e alimentação que serão divulgadas nas embalagens dos produtos.
Além disso, seguindo o exemplo de seus colegas no McDonald's, a empresa avisa que, a partir de 2003, deixará de usar óleos hidrogenados em suas frituras e passará a usar só óleo sem ácido graxo. O plano é que, num futuro próximo, pelo menos 50% dos produtos da Pepsi possam ser chamados de "nutritivos".
Por fim, num movimento que lembra o que chacoalhou a indústria do cigarro há alguns anos, pais de alunos e professores de escolas públicas americanas começam a pedir a revisão dos contratos firmados entre instituições de ensino e empresas de fast food.
Os acordos permitem que nomes como McDonald's e Pizza Hut sejam os fornecedores de merenda escolar. Hoje, 43% das escolas americanas de ensino básico e todas as escolas de ensino médio têm máquinas de fast food, doces ou refrigerantes nos refeitórios.
A briga tomou os jornais quando o endocrinologista infantil David Ludwig publicou um estudo em que afirma que os refrigerantes contribuem para a obesidade infantil. Logo, o lobby das indústrias de refrigerantes divulgou um contra-estudo, que afirma que refrigerantes são necessários para uma "dieta equilibrada".
Mesmo assim, no mês passado, Los Angeles proibiu a bebida gasosa durante o horário escolar. A Pepsi foi a primeira a capitular.
No começo do verão norte-americano, a Pepsi mandou um vídeo institucional direcionado aos responsáveis pelas merendas escolares em que um porta-voz da empresa diz, pela primeira vez na história, com todas as letras: "Alimentos como Pepsi-Cola e Doritos são um prazer, uma compensação. O consumo exagerado de nossos produtos não é algo que incentivamos ou mesmo recomendamos".

Consumidor "enganado"
Caesar Barber resolveu mover a ação porque se sentiu "enganado" por quatro empresas: McDonald's, Wendy's, Burger King e Kentucky Fried Chicken.
"Eles dizem "100% carne", e eu pensei que isso queria dizer que era saudável", disse em seu depoimento. "As pessoas nos comerciais não dizem o que há na comida. É gordura, gordura e mais gordura. Fiquei obeso", disse Barber, que afirma se alimentar basicamente de fast food há 40 anos.


Texto Anterior: Senegal: Mortos em naufrágio podem ser mais de 900
Próximo Texto: McDonald's abre maior loja do mundo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.