São Paulo, sexta-feira, 30 de setembro de 2011 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
MOISÉS NAÍM A China terá um acidente?
A economia do planeta irá para onde for a da China. Caso sofra um acidente econômico importante, os danos serão muito mais vastos e profundos que os da crise europeia atual. Será que na próxima década a China sofrerá um acidente que reduza seu crescimento econômico? Infelizmente, é provável que sim. A economia chinesa é como um carro veloz avançando por uma estrada de terra. Cedo ou tarde, topará com um buraco. Será um choque duro. O acidente da China pode ser econômico, ecológico, social ou internacional. Para que se torne sério o suficiente para colocar em perigo a performance econômica total do país, terá que transbordar para mais de uma região e tornar-se uma crise política de primeira grandeza. Um acidente financeiro ou ecológico pode ser justamente o gatilho de uma turbulência política ampla. Um crash da Bolsa que elimine uma parcela grande das economias das pessoas e as leve a sair às ruas, a contaminação da fonte de água de uma metrópole ou uma escaramuça com o Exército indiano em qualquer um dos pontos contestados da fronteira podem não ser, por si sós, suficientes para gerar instabilidade que faça a economia descarrilar. Mas esses incidentes -ou outros difíceis de prever- podem ser a faísca que acenda uma turbulência política ampla que faça a economia desacelerar. A Primavera Árabe foi desencadeada pela imolação de um vendedor de frutas em uma pequena cidade do interior da Tunísia. O Banco Mundial prevê que, entre 2016 e 2020, a economia chinesa cresça 7% ao ano. É uma previsão muito otimista e que presume que não haverá acidentes. Mas mesmo esse índice mais otimista está 30% abaixo do índice atual e da média da década passada. Também a inflação está virando um problema. Nos últimos dez anos, esteve em menos de 2% ao ano. Agora está em mais de 6%, e os preços sobem, especialmente os dos alimentos. Durante a era de Mao, a desigualdade era quase inexistente e, fosse qual fosse seu nível, era invisível para o resto da população. Hoje ela se equipara às piores do mundo e é altamente visível. Trabalhadores urbanos podem ganhar três vezes mais que camponeses da zona rural, e o número de chineses que ingressam na fileira dos bilionários do mundo quebra um recorde todos os anos. A corrupção está por toda parte, e, apesar de algumas prisões de vez em quando -e até mesmo da pena de morte ocasionalmente aplicada a funcionários governamentais acusados de corrupção-, vem sendo largamente tolerada até agora. Uma queda econômica profunda e prolongada fará da corrupção uma fonte importante de revolta social e protestos. O mesmo se aplica aos problemas ecológicos crescentes, que, para muitos chineses, não são abstrações: há limites ao quanto as pessoas toleram receber em suas casas água marrom e malcheirosa para cozinhar ou tomar banho. É fácil traçar uma lista dos gatilhos potenciais e das situações que os tornariam mais explosivos. O que não é fácil é saber qual deles será a faísca a desencadear uma turbulência que desacelere o crescimento chinês. Ou quando. Ou, ainda, se a China terá sorte e evitará um acidente. E com isso poupe o resto de nós de um acidente. Twitter: @moisesnaim Tradução de CLARA ALLAIN AMANHÃ EM MUNDO Paul Krugman Texto Anterior: Strauss-Kahn e jornalista mantêm lados em acareação Próximo Texto: Bahrein condena médicos e enfermeiros Índice | Comunicar Erros |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |