|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SUCESSÃO NOS EUA /ANTES E DEPOIS
No gabinete, Obama monta balaio-de-gatos de centro
Escolhas de democrata alienam progressistas e arrancam elogios de conservadores
A mudança é ele, resume presidente eleito, para justificar presença de veteranos, clintonistas e republicanos no gabinete; aposta pode ricochetear
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Se Barack Obama confirmar
amanhã os nomes ventilados
para o seu gabinete, o presidente eleito fará um governo conservador em política externa,
de centro em economia e progressista na área social. Para
tanto, contará com democratas
clintonistas, republicanos moderados e grandes egos.
Cada um dos cinco nomes
principais parece negar uma
promessa de campanha. Com
Hillary Clinton no Departamento de Estado, ele pode aposentar o slogan "Obama sem
drama", com que diferenciava
sua bem regida equipe de campanha da rede de intrigas que
era a da então rival nas prévias.
A continuação de Robert Gates na Defesa remete a tudo o
que ele dizia que seria o governo de seu então adversário,
John McCain, mais quatro
anos de George W. Bush. A impressão é reforçada pelo convite ao general reformado Jim
Jones para conselheiro de Segurança Nacional -cargo que o
militar provavelmente teria se
seu amigo McCain fosse eleito.
Se Eric Holder, o provável secretário da Justiça, traz a diversidade prometida por Obama
ao ser o primeiro negro na pasta, carrega também uma bagagem clintoniana que deve complicar sua confirmação pelo Senado: ele defendeu o polêmico
perdão dado por Bill Clinton ao
milionário Mark Rich, condenado por evasão fiscal e por negociar com empresas iranianas
na crise dos reféns (1979-81).
Por fim, o único nome anunciado oficialmente até agora, do
futuro secretário do Tesouro
Timothy Geithner, também
não chega sem polêmicas. O
atual presidente da unidade de
Nova York do Federal Reserve
(banco central dos EUA) trabalhou ativamente pelas recentes
operações de salvamento de
instituições financeiras -que,
com a persistência da crise, viraram alvo de críticas.
Além disso, Geithner ficará
sob a sombra de duas das personalidades mais fortes da área
econômica progressista, Lawrence Summers e Paul Volcker. O primeiro será diretor do
Conselho Econômico Nacional, cargo que, por estar diretamente ligado à Casa Branca,
oferece maior acesso ao presidente do que o do Tesouro.
O segundo comandará o recém-criado Conselho Consultivo de Recuperação Econômica,
cuja principal função será "dar
ao presidente conselhos diretos e francos" sobre como lidar
com a crise.
É uma combinação explosiva, que pode tanto dar no tão falado "time de rivais" de Abraham Lincoln (1861-65) quanto
no ninho de cobras que cercava
Richard Nixon (1969-74). Obama e equipe vêm tentando desfazer os temores. Em entrevista
na semana passada, o eleito
usou outras palavras para dizer
que a estrela do show era ele e
que ele representa a mudança.
"Eu sei que há uma certa impressão em Washington de que
nós estamos reciclando as pessoas do governo Clinton", admitiu Obama na quarta, para
logo se defender: "A última gestão democrata que tivemos foi
a dele". Disse ainda que a crise
atual não lhe permite nomear
pessoas sem experiência na
área econômica, por exemplo.
"Mas o que nós vamos fazer é
combinar experiência com
pensamento novo", definiu, para então resumir: "Entenda de
onde virá a visão de mudança,
em primeiro lugar e de maneira
mais importante: de mim".
Nem todos estão convencidos. A ala mais progressista do
pensamento político ainda dá o
benefício da dúvida ao presidente eleito, mas fissuras já são
detectadas. "Um ano atrás,
quando Obama disse que era
hora de virar a página, sua declaração de campanha parecia a
promessa de um novo começo
para Washington", disse William Greider, da revista "Nation". "Eu não sabia que seria
uma página virada para trás."
Por outro lado, de forma talvez reveladora, conservadores
aplaudem cada vez mais o futuro gabinete. Anteontem, Karl
Rove, polêmico ex-conselheiro
de Bush, disse que o democrata
montou "um time econômico
de primeira". No mesmo dia, o
"Wall Street Journal" escreveu
que "Gates e Jones são sinais
bem-vindos de continuidade".
Texto Anterior: Artigo: Encontrando o centro da Índia Próximo Texto: Clintonistas e doadores são o exército obamista Índice
|