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Voto pode ser resposta política a
radicalismo, diz analista libanês
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
É cedo para tirar conclusões otimistas sobre as eleições de ontem
no Iraque. Mas o próprio fato de
elas terem ocorrido poderia representar o fortalecimento do entendimento político sobre o radicalismo religioso, sobretudo
aquele apregoado pelo representante da Al Qaeda no país, Abu
Musab Al Zarqawi, para quem a
democracia "é antiislâmica".
É o que diz o cientista político libanês Fawaz Gerges, professor do
Sarah Lawrence College, universidade no Estado de Nova York. Ele
é autor de "Islã Americano e Político" e está para publicar "Jihadists: Unholy Warriors" (jihadistas, guerreiros não-sagrados).
Eis os principais trechos de sua
entrevista.
Folha - Aparentemente o comparecimento às urnas foi maior, e o
número de vítimas de atentados,
menor que o esperado.
Fawaz Gerges - Precisamos esperar mais um pouco para tirar conclusões definitivas. Não creio que
se deva acreditar, por enquanto,
na taxa de comparecimento
anunciada pelo governo provisório. As eleições ocorreram, é verdade. Mas em muitas das cidades
sunitas os locais de votação não
chegaram sequer a abrir, e ninguém votou. Os que votaram demonstraram confirmar no surgimento de uma instância política.
Folha - Mesmo assim o apelo ao
boicote por motivos religiosos, lançado por Abu Musab al Zarqawi,
não foi ouvido.
Gerges - Creio que Zarqawi e o
que ele representa, a Al Qaeda e a
jihad (guerra santa), não tiveram
um poder de mobilização tão
grande quanto alguns previam.
Em termos de islamismo, foi bem
mais importante a tomada de posição do aiatolá Ali Sistani, para
quem votar era "um dever religioso". De qualquer modo, Zarqawi e
seu grupo são apenas uma parte
da insurgência. Outros agrupamentos laicos também pregaram
o boicote. É cedo para saber se,
para eles, a abstenção foi em parte
uma demonstração de força.
Folha - O sr. acredita que o Baath
saiu fortalecido?
Gerges - Estou entre os que não
acreditam que os adeptos do regime deposto sejam politicamente
fortes. Eles formam uma minoria,
a meu ver de pouco peso.
Folha - Com a abstenção, qualquer que tenha sido ela, a oposição
tenderia a cantar vitória?
Gerges - É uma oposição muito
dividida. Ela se unificou de modo
circunstancial em torno da tese de
que as eleições favoreceriam a lógica das forças estrangeiras de
ocupação. Mas, para muitos iraquianos -e não sei o quanto eles
representam em termos de porcentagem-, as eleições foram
bem mais que isso. Foram, por
exemplo, a oportunidade de criação de um poder local para negociar a retirada dos estrangeiros.
Folha - A inexpressiva presença
de candidatos sunitas não compromete a legitimidade da eleição como um todo?
Gerges - É um problema bastante sério. Mas é preciso esperar. A
Assembléia poderá ter uma margem de manobra que, se for bem
conduzida, catalisaria a adesão ao
processo político daqueles que
não participaram da votação. Mas
ainda é cedo para tirarmos conclusões semelhantes.
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