São Paulo, segunda-feira, 31 de janeiro de 2005

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Europeus terão de colaborar, diz analista

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

O alto comparecimento às urnas no Iraque foi uma vitória para o presidente George W. Bush e deverá fazer que líderes europeus que foram contrários à Guerra do Iraque tenham menos dificuldade em colaborar com o futuro governo do país, pois atenuará a pressão popular européia contra isso.
A análise é de Charles Kupchan, diretor de estudos europeus do Council on Foreign Relations, que foi membro do Conselho de Segurança Nacional dos EUA durante o governo do democrata Bill Clinton (1993-2001) e é autor de, entre outros, "The End of the American Era: U.S. Foreign Policy and the Geopolitics of the Twenty-First Century" (o fim da era americana: a política externa dos EUA e a geopolítica do século 21).
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.

Folha - O alto comparecimento às urnas foi uma vitória para Bush?
Charles Kupchan -
Indubitavelmente. Deve-se, todavia, ressaltar que ele não resolve os graves problemas do Iraque, que será necessário inserir os árabes sunitas no processo político iraquiano e que a violência persistirá, podendo até intensificar-se a curto prazo.
Por outro lado, é claro que se trata de um triunfo para o governo americano. Este, desde o início de 2003, afirma que os iraquianos desejam a consolidação da democracia no país. Se os xiitas perceberem que, para evitar a guerra civil, será preciso admitir a participação da comunidade sunita na redação da Constituição e no futuro governo, o caminho para uma melhora significativa da situação estará aberto.

Folha - Os países europeus que se opuseram à guerra e à ocupação serão obrigados a levar em consideração o sucesso da votação?
Kupchan -
Trata-se de uma situação delicada para alguns países, como a França, a Alemanha, e a Rússia. Vladimir Putin [presidente russo] chegou até a manifestar sua preocupação com a lisura do pleito iraquiano.
Porém agora é impossível não levar em conta que cerca de 60% dos eleitores inscritos no Iraque compareceram às urnas. Esse é um percentual significativo para qualquer país que deseja tornar-se democrático.
Assim, os europeus deverão reconhecer que as eleições constituíram um passo positivo para a estabilização e terão de colaborar. À medida que as novas autoridades iraquianas ganharem mais poder e os EUA perderem influência, os Estados europeus passarão a aproximar-se desses líderes, e as relações entre o Iraque e a Europa melhorarão.

Folha - Isso servirá para atenuar a tensão entre os países europeus que se opuseram à guerra, como a França e a Alemanha, e os EUA?
Kupchan -
É provável que isso ocorra. Ambas as partes já se mostraram dispostas a abrandar as tensões transatlânticas. Os franceses já fizeram alguns gestos nessa direção, como a recepção dada ao presidente do Iraque [Ghazi al Yawer] por Jacques Chirac [presidente francês]. E Bush visitará a Otan [aliança militar ocidental] e a União Européia em fevereiro, em Bruxelas.
O desfecho das eleições iraquianas tira certa pressão das costas dos líderes europeus, pois eles poderão dizer à sua população que uma maior colaboração com o Iraque é necessária para que os políticos eleitos pelo povo possam controlar a situação. Além disso, a disseminação do terror iraquiano pelo Oriente Médio e até pela Europa não interessa a ninguém.


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