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MÍDIA
Nic Robertson diz que se sentiu mais intimidado com a pressão iraquiana do que com a guerra
Repórter da CNN expulso relata medo
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Que tal pegar um carro e viajar
por cerca de 12 horas pelas estradas do Iraque? Agora imagine fazer essa mesma viagem sendo um
cidadão inglês, com cabelos bem
loiros, carregando o crachá de
uma TV dos Estados Unidos.
Nic Robertson, correspondente
da CNN, encarou essa assustadora jornada na semana passada.
Foi expulso do país pelo governo
de Saddam Hussein, que considerou a cobertura da rede favorável
às forças anglo-americanas.
Ele e os três colegas que formavam sua equipe deixaram Bagdá
às pressas, com a determinação
de oficiais iraquianos de não mostrarem na televisão nada do que
encontrassem pelo caminho.
Veterano em conflitos internacionais (esteve na Guerra do Golfo, na Bósnia, em Kosovo e no
Afeganistão, entre outros), ele
disse que seu maior medo foi a
ameaça de expulsão de Bagdá antes do início dos bombardeios.
Leia abaixo a entrevista que ele
concedeu à Folha, por e-mail, em
que falou de seu trabalho e do fato
de as emissoras norte-americanas
estarem sendo acusadas de conservadorismo e parcialidade.
Folha - Após a expulsão, como foi
a viagem rumo à Jordânia? O que
viram e por que não mostraram nada ao vivo no caminho?
Nic Robertson - Nós não tínhamos como mostrar nada ao vivo,
porque oficiais iraquianos controlavam o uso de telefone por satélite. Também não possuíamos
os equipamentos modernos que
os repórteres que acompanham
as tropas usam. Fiquei aflito no
início da retirada de Bagdá.
Pela rodovia principal, encontramos pouca evidência de ação
militar, até que vimos um caminhão destruído. À medida que
nos aproximávamos da fronteira
com a Jordânia, fomos nos deparando com pistas de vôo, agora
controladas pelas forças de coalizão, nas quais avistamos veículos
militares iraquianos incendiados.
Folha - O Pentágono havia orientado os jornalistas a deixar a capital iraquiana antes das primeiras
explosões. A decisão de permanecer foi sua ou solicitação da CNN?
Robertson - Nós decidimos ficar,
porque achávamos que estaríamos seguros. E porque acho muito importante contar essa história. Contar a história das pessoas
do Iraque.
Folha - Como era a sua rotina
quando estava em Bagdá?
Nic Robertson - Nós estávamos
tentando encontrar histórias humanas interessantes. Com as informações que recebíamos do
Ministério da Informação, cobríamos a vida das pessoas em
Bagdá. Às 16h (no horário local),
começávamos a entrar no ar ao
vivo e só parávamos de trabalhar
por volta da meia-noite. Também
tínhamos de cobrir fatos ligados
ao governo iraquiano.
Folha - Tiveram problemas para
arrumar iraquianos que trabalhassem com vocês, como motoristas e
intérpretes, por exemplo?
Robertson - A CNN mantinha
um escritório em Bagdá havia
mais de 12 anos. Logo, não tivemos dificuldades em trabalhar
com as pessoas do local.
Folha - Até agora, qual foi o momento em que sentiu mais medo?
Robertson - Fiquei assustado
quando pensei que os oficiais do
Iraque iriam nos expulsar antes
de a guerra começar. Havia muita
pressão governamental. Fiquei
com menos medo quando as explosões começaram.
Folha - Na época da guerra no
Afeganistão, Alfredo de Lara, cinegrafista de sua equipe, nos contou
que deixara a barba crescer para ficar mais parecido com a população
local e chamar menos a atenção.
Você é loiro, tem nome e cara de
anglo-americano. Enfrentou problemas com os iraquianos por isso?
Robertson - Não tive problemas.
O povo iraquiano é muito simpático com os estrangeiros, são pessoas ótimas. Devem estar bem diferentes agora, em razão da desordem civil. Quanto mais a guerra
foi se aproximando, os iraquianos
foram ficando menos amistosos
com americanos e ingleses.
Mas eles reconheciam que nós,
jornalistas, não éramos os responsáveis pela guerra.
Folha - No conflito do Afeganistão, você e De Lara eram os únicos
jornalistas estrangeiros na capital,
Cabul. Aquela cobertura, em função disso, foi mais importante do
que a atual para a sua carreira?
Robertson - Eu não penso em
termos do que é bom para a minha carreira. Faço a melhor cobertura que posso fazer.
Folha - Como avalia as críticas de
que as TVs norte-americanas estão
fazendo uma cobertura parcial e
conservadora, pautada apenas pelas informações oficiais do governo
dos Estados Unidos?
Robertson - Estou muito orgulhoso do meu trabalho em Bagdá.
Como se sente estando tantos
dias longe de sua família?
Robertson - Falo com minha família todos os dias. Estaria melhor se estivesse em casa. Mas eles
estão felizes porque tenho uma
profissão que me faz feliz.
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