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Pilotos da coalizão sofrem choque de realidade
"As bombas explodem em fragmentos. E, de repente, a gente só vê um clarão azul e branco na frente do avião"
LYNETTE CLEMETSON
DO ""NEW YORK TIMES",
NO PORTA-AVIÕES ABRAHAM LINCOLN
Depois de todos os boletins, o
treinamento, o vôo e a espera, a
guerra contra o Iraque não se desenrolou como o tenente Dewaine Barnes, do esquadrão VFA-115, tinha previsto.
A ação militar começou inesperadamente com os mísseis para
matar Saddam Hussein. A guerra
aérea, marcada por mísseis teleguiados, transformou-se em poucos dias num cenário de risco,
com o lançamento de bombas
servindo para abrir espaço para o
avanço das tropas terrestres.
E na quinta-feira, depois de dias
de exaustivas missões sobre o Iraque, com o tempo desfavorável,
problemas de combustível e uma
situação difícil para as tropas terrestres, o piloto do caça F/A-18
atirou sua primeira bomba.
Ao explicar como se sentiu após
o ato -a primeira vez que o fez
em mais de uma semana de guerra-, Barnes, cuidadoso com palavras, começou a se dizer ""desapontado", mas depois se conteve.
""Acho que eu não estava imaginando que não fosse jogar. Afinal
de contas, trata-se de uma guerra", disse Barnes, 28.
A reação do jovem piloto de
Pensacola não foi muito diferente
da de outros pilotos que estão no
porta-aviões Abraham Lincoln,
no golfo Pérsico. Desde que a
guerra começou, estão todos
preocupados em levar adiante sua
missão, para a qual foram treinados durante meses.
Para Barnes, que se tornou um
piloto para continuar o legado do
grupo de pilotos negros que participaram da Segunda Guerra
Mundial (1939-1945) e que abriram caminho para pessoas como
ele, o desejo de participar da guerra é explicado por motivos pessoais, mas também pelo senso de
responsabilidade.
As primeiras missões aéreas da
coalizão tiveram problemas de
abastecimento, e
quatro de 12
aviões viraram
""tanques", para
armazenar combustível para as
demais aeronaves.
De cara, Barnes
sofreu forte bombardeio das tropas
terrestres leais a
Saddam. Depois
de ter feito várias
missões pelo espaço de exclusão
aérea do Iraque nos últimos meses, Barnes já tinha enfrentado o
ataque dos rivais, mas nunca com
tanta intensidade como nos primeiros dias da guerra.
""Uma vez que o ataque da artilharia atinge uma certa altura, as
bombas explodem em fragmentos", afirmou. ""E, de repente, a
gente só vê um
clarão azul e
branco na frente
do avião."
Ter de voar em
áreas para as
quais o comando
terrestre ordena e
que estão repletas
de civis ou das
próprias tropas
de coalizão significa outra missão
perigosa.
Manter o foco,
ele disse, exige alto nível de mentalização, onde os dias giram apenas em torno das missões. Jogos
de gamão, uma das atividades
prediletas há pouco mais de uma
semana, parecem uma memória
distante.
Embora ele ainda consiga tempo para mandar e-mails a seu melhor amigo, o tenente Isaac Shareef, que também é piloto e participa da operação no Iraque, as
mensagens trocadas, bem curtas,
se limitam a dizer que estão bem.
Quando sai em missão, Barnes,
como vários dos pilotos que fazem parte de seu esquadrão, tem
um dia puxado. Chegou a fazer
duas missões em um só dia, com a
primeira começando às 7h45 e a
segunda terminando 12 horas depois. Teve apenas um intervalo de
45 minutos. ""Você está fazendo
planos, voando, dormindo ou comendo", afirmou.
Mas logo ele coloca seu papel
em perspectiva. As últimas tempestades de areia tornaram os
vôos os mais perigosos que ele ou
seus colegas já fizeram. ""Não importa o quão seja difícil lá fora para a gente, temos de dar um jeito
de voltar ao porta-aviões."
E, enquanto o tempo passa, no
intervalo entre uma missão e o
curto período de descanso antes
de começar a próxima, Barnes repensa sua resposta sobre jogar ou
não jogar mais bombas.
Bombardeios ou não, ele conta,
as lições que aprendeu nos primeiros dias da guerra são muito
mais fortes do que todas as que teve até então.
""É estranho quanta coisa pode
acontecer em apenas uma semana", filosofou, antes de partir para
umas poucas horas de sono.
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