São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 2008

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Oposição reivindica vitória no Zimbábue

Demora na divulgação de resultados oficiais da eleição presidencial aumenta tensão no país e alimenta medo de fraude

Monitores africanos dizem que votação foi legítima; citando ONGs, diplomata afirma que MDC derrotou Mugabe no primeiro turno

Tsvangirayi Mukwazhi/Associated Press
Zimbabuanos em Harare festejam vitória da oposição antes de saírem resultados; governo alerta que reivindicar Presidência sem ter números é golpe de Estado

FÁBIO ZANINI
EM HARARE

ANDREA MURTA
ENVIADA ESPECIAL A HARARE

Sem resultados oficiais divulgados e nenhuma pesquisa independente, a oposição zimbabuana clamou vitória ontem na eleição presidencial mais disputada dos 28 anos de independência da nação do sul da África e indicou que irá para as ruas caso isso não seja confirmado, o que aumentou consideravelmente a tensão no país.
Pela manhã, com base na apuração própria de um terço das urnas, o MDC (Movimento para Mudança Democrática) alegava que seu candidato presidencial, o ex-líder sindical Morgan Tsvangirai, tinha 67% dos votos. "Até agora, a não ser que ocorra um milagre, vencemos essa eleição. A tendência é irreversível", disse Tendai Biti, secretário-geral do partido.
O governo reagiu. "Isso [anunciar resultados não-oficiais] é golpe de Estado, e nós sabemos como lidar com isso", disse George Charamba, porta-voz do governo chefiado desde 1980 pelo ditador Robert Mugabe, 84, novamente candidato a um mandato de cinco anos. A comissão eleitoral repreendeu o MDC por reivindicar a Presidência sem números oficiais.
As ruas de Harare permaneciam calmas ontem, quase desertas. Mas a falta de qualquer tipo de resultado, ainda que preliminar, um dia após o fechamento das urnas, provocou críticas de observadores e medo de fraudes.
A Rede Zimbabuana de Apoio às Eleições (Zesn), grupo civil que fiscaliza o processo, soltou comunicado criticando a demora. "Pedimos à comissão eleitoral que tabule os resultados o mais rápido possível. O anúncio de forma transparente ajudaria a reduzir tensões."
Já a missão de observadores da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, que reúne 13 países, considerou a votação "pacífica e uma expressão fiel da vontade do povo do Zimbábue", apesar de ter enxergado "incidentes" como cobertura enviesada da imprensa oficial e falta de informação dos eleitores. Numa confusa entrevista coletiva, o chefe da missão, o angolano José Marcos Barrica, teve de explicar como poderia reconhecer a lisura do processo antes da divulgação de qualquer resultado. "Resultados não são problema nosso", explicou.

Especulações
Apenas às 23h50, a comissão eleitoral informou que começaria a divulgar resultados no início desta manhã (madrugada de hoje no Brasil).
Isso tornou fértil o terreno para especulações. Um embaixador europeu que pediu para não ser identificado distribuía ontem à tarde a jornalistas supostos resultados extra-oficiais da apuração, baseados na contagem feita por ONGs. Tsvangirai teria ganho no primeiro turno com 55% dos votos, contra 36% de Mugabe e 9% do independente Simba Makoni. Não houve confirmação oficial.
Caso haja segundo turno, ele ocorrerá em três semanas.
No quartel-general de Tsvangirai, um prédio deteriorado de seis andares no centro da capital, que ontem não tinha energia elétrica nem elevadores, o dia foi de muitas reuniões e nervosismo. "Estamos esperando o governo vir para cima de nós a qualquer momento", disse Sandra (não deu o sobrenome), do setor de informações da campanha. "Não acredito que aceitem nossa vitória."
O temor de que uma onda de violência similar à que ocorreu no Quênia no início do ano se repita é palpável em Harare, cidade que é reduto da oposição.
Os comandantes das Forças Armadas já avisaram que não pretendem reconhecer um governo que não seja de Mugabe. Algumas escolas têm recomendado aos pais deixar seus filhos em casa nos próximos dias.


ANDREA MURTA viajou a convite das ONGs Conectas Direitos Humanos e Open Society


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