São Paulo, segunda-feira, 31 de agosto de 2009

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Com economia estagnada, Japão sofre com sem-teto

Parque em Tóquio vira acampamento de camponeses e de desempregados

Japoneses sem emprego recorrem até a cibercafés como opção para dormir; na campanha, PDJ prometeu criar fundo para os sem-teto

Raul Juste Lores/Folha Imagem
Tokumalu Nuliasu, que vive há 6 meses em parque de Tóquio

DO ENVIADO A TÓQUIO

Dezenas de barracas de plástico azul, espalhadas ao longo do parque Ueno, um dos maiores de Tóquio, são um dos reflexos da estagnação econômica que atinge o Japão há quase duas décadas.
Nelas, moram desde camponeses que tentaram a vida na capital até aqueles que deixaram suas famílias por não suportar o desemprego.
Os sem-teto viraram tema da campanha eleitoral. O Partido Democrata do Japão, grande vencedor do pleito de ontem, prometeu criar um fundo para quem não tem moradia.
Nos últimos anos, esse grupo cresceu. Além do parque, a reportagem também viu barracas azuis ao longo do rio Sumida. Na estação de trens e metrô de Shinjuku, a maior de Tóquio, 50 pessoas dormiam na noite de ontem em caixas de papelão transformadas em cama. A cena se repete nas estações de Ikebukuro e Shibuya.
O aluguel de um apartamento de 30 m2 em Tóquio custa pelo menos 75 mil ienes (R$ 1.532).
Jovens desempregados, que não conseguem mais pagar aluguel, improvisam moradia até em cabines de cibercafés. Eles chegam às 18h e pagam mil ienes (R$ 21) para passar a noite no cubículo. Tiram os sapatos e dormem sentados, nem sequer fingindo que estão navegando na rede.
Alguns tomam banho no próprio estabelecimento. O governo de Tóquio estima que há 5.000 moradores temporários de cibercafés desde o final de 2008.
Os números dos sem-teto são irrisórios se comparados ao Brasil, mas são um contraste para uma das cidades mais opulentas do mundo.
Tóquio é o maior mercado de marcas de luxo do planeta. As ruas comerciais de Nova York e Londres parecem modestas comparadas às de Ginza e Omotesando, com lojas desenhadas por arquitetos de fama internacional.

Vergonha
A sociedade igualitária surgida no Japão do pós-guerra, com uma sólida classe média, também está em crise.
"Faço bicos como mecânico, conserto televisores e posso ganhar 5.000 ienes (R$ 102) em um dia", disse à Folha o desempregado Tokumalu Nuliasu, 52. Ele mora há seis meses em uma barraquinha de plástico em Ueno.
Até os 38 anos, Tokumalu trabalhava em uma fábrica de eletrônicos, que produzia fliperamas. De lá para cá,teve empregos de contrato temporário em linhas de montagem de televisores e eletrodomésticos.
Desde o ano passado, não volta ao sul do Japão, onde mora a sua família, "por vergonha". A prefeitura já tentou remover a sua barraca, mas "eles sabem como está a situação, então preferem olhar para o outro lado".
Vizinhos de Tokumalu, que se negaram a revelar a identidade, contam que catam latas usadas pela cidade e vendem a 75 ienes o quilo (R$ 1,50).
Tokumalu não votou ontem, mas tem esperanças. "Acho que o país pode mudar, porque os democratas são mais humanos, gostam dos mais pobres, mas vai levar tempo", diz.
"O Japão está endividado, e temos cada vez mais velhos. Eu não tenho aposentadoria, quem vai pagar por ela?", pergunta. (RJL)


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