São Paulo, quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Insurgentes pedem que polícia volte ao trabalho, sem medo

Maioria dos agentes não retornou após tomada de Trípoli; eles ainda são vistos pela população como parte do regime

Teme-se que desertores tenham morrido ou tenham sido executados; rebeldes fazem apelo na TV

SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A TRÍPOLI

O policial Siraj Abu Zadi, 29, desertou e rasgou o uniforme após o início do levante contra o ditador Muammar Gaddafi, em fevereiro. Ontem, ele voltou ao trabalho pela primeira vez em cinco meses. "Gaddafi já era, e estou muito feliz", afirma, segurando um fuzil Kalashnikov na entrada da delegacia central de Trípoli.
O uniforme novo de Abu Zadi está pronto, mas ele prefere continuar vestido à paisana. Policiais são alvo fácil para líbios que queiram se vingar por décadas de opressão e violência do governo.
O capitão Nureddin Kaabar, 39, chefe da delegacia, manteve-se fiel ao cargo até o final, mas garante não ser simpatizante de Gaddafi. "Sou apenas um homem a serviço da segurança pública, com ou sem Gaddafi. E agora recebo ordens do conselho revolucionário [rebelde]", disse, usando uniforme azul-claro da polícia.
Enquanto o capitão conversava com a Folha, um bate-boca acalorado acontecia do lado de fora da delegacia. Jovens rebeldes exigiam aos gritos que a polícia emitisse autorização de porte de arma. Policiais argumentavam que a decisão não dependia deles, mas do comando insurgente militar.
"Onde vocês estavam na hora de combater o regime? Vocês por acaso lutaram ao nosso lado?", exaltava-se um rebelde, apontando o dedo para o rosto dos policiais.
A atuação da polícia na era pós-Gaddafi é um dos desafios do CNT (Conselho Nacional de Transição), que reúne a cúpula política e militar do movimento insurgente.
O controle das milhares de armas saqueadas -a missão mais urgente- fica a cargo de uma força policial abalada pela falta de braços.
Oficiais ouvidos pela Folha garantem não ter registrado aumento da criminalidade no período de turbulência, mas pedem reforços. A maioria dos 20 mil agentes de Trípoli ainda não retomou o trabalho. Teme-se que desertores tenham morrido ou tenham sido executados.
A Folha passou a tarde circulando de carro pela capital sem ver nem sequer um policial uniformizado. Apenas 16 dos 60 policiais da delegacia do capitão Kaabar trabalhavam ontem.
O CNT pediu na TV que todos os policiais voltassem aos postos sem medo de punição. O apelo parece destinado a evitar o cenário iraquiano, no qual a polícia de Saddam Hussein foi desmantelada.
Numa outra delegacia, no bairro Suk al Jumaa, um retrato de Gaddafi foi colocado no chão da porta principal, pisoteado a todo instante.
Numa parede do saguão principal há fotomontagens e caricaturas de Gaddafi em posições degradantes.


Texto Anterior: Diário de Trípoli: Cidade tem uma hiperinflação de produtores
Próximo Texto: Frase
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.