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O pequeno Qatar ganha influência

Emir do Qatar procura conciliar interesses opostos na região

Bryan Denton/The New York Times
Usando sua riqueza petrolífera e a Al Jazeera, o Qatar busca ampliar seu papel na região
Usando sua riqueza petrolífera e a Al Jazeera, o Qatar busca ampliar seu papel na região

por ANTHONY SHADID

DOHA, Qatar - Com apenas 225 mil pessoas, a população nativa do Qatar não lotaria um dos bairros maiores do Cairo. Mas esse país minúsculo que inspira irritação e admiração em igual medida já se mostrou decisivo em isolar o líder da Síria, ajudou a derrubar o ex-líder da Líbia, ofereceu-se como mediador no Iêmen e conta como aliada a figura mais poderosa da Tunísia.

Esta península de areia do formato de um polegar que se projeta no Golfo Pérsico emergiu como o mais dinâmico país árabe no meio da turbulência que está realinhando a região. Suas intenções ainda não estão claras. Mas a influência que exerce representa uma lição sobre o que se pode conseguir com a ajuda de algumas das maiores reservas de gás natural do mundo, a rede noticiosa mais influente da região, a Al Jazeera, contatos extensos e o poder político concentrado nas mãos de um só homem, o emir e monarca absoluto do Qatar, xeque Hamad bin Khalifa al Thani.

O Qatar tornou-se um contraponto vital em um mundo árabe onde as potências tradicionais estão tumultuadas por revoluções, ossificadas por lideranças envelhecidas, ou ainda cambaleando devido aos efeitos de guerras civis, e onde os Estados Unidos, cada vez mais, são vistos como uma potência em declínio.

"O Qatar está ocupando um espaço e exercendo um papel que não está sendo assumido por outros países", explicou Bassma Koudmani, líder oposicionista sírio, que atribuiu ao Qatar um papel chave na decisão surpreendente anunciada pela Liga Árabe em 12 de novembro de suspender a Síria. O Qatar sempre exerceu um papel desproporcional no Golfo, mas nunca antes tão grande.

Irados com a atuação do Qatar em incentivar a votação da Liga Árabe, autoridades sírias tacharam o país de lacaio dos interesses americanos e israelenses. Em 14 de novembro a Síria declarou que vai boicotar os Jogos Árabes, que terão lugar em Doha em dezembro.

O Qatar está promovendo uma mudança decisiva na política árabe: um Oriente Médio dominado por partidos islâmicos moderados, conduzidos ao poder em uma região que é mais democrática, conservadora e turbulenta.

"O Qatar é um país sem ideologia", ponderou o analista político Talal Atrissi. "Os qatarianos sabem que os islâmicos são a nova potência no mundo árabe. Esta aliança vai deitar os alicerces para influência em toda a região."

Os sentimentos pessoais parecem exercer papel importante na política do Qatar, como foi o caso em relação à Líbia, onde a esposa do emir viveu por algum tempo quando criança. Durante muito tempo o Qatar atuou como intermediário com a Síria e investiu fortemente na economia desta.

Mas diplomatas e analistas dizem que o xeque Hamad se sentiu repudiado pelo presidente Bashar al-Assad em abril, pouco depois de começar o levante sírio.

Alguns enxergam a política do Qatar na Síria por uma ótica sectária, na medida em que o Qatar apóia uma revolta predominantemente sunita (o país também apoiou a intervenção da Arábia Saudita no vizinho Bahrein para sufocar protestos xiitas).

Outros a vêem como sendo mais oportunista, oferecendo ao Qatar uma maneira de realinhar um Oriente Médio em que a Síria muitas vezes colocou potências rivais umas contra as outras -Turquia, Irã, Israel, Arábia Saudita e atores diferentes no Líbano.

"A Síria é um pivô crucial no Oriente Médio", disse Salman Shaikh, diretor do Centro Brookings Doha, no Qatar. "Ela seria um alvo tentador demais para não suscitar envolvimento externo, e estou certo de que os qatarianos estarão envolvidos."

A ambição domina Doha. O emir vem buscando conciliar partes que se poderia imaginar inconciliáveis. Yusuf Qaradawi, um islâmico egípcio influente, vive no Qatar.

O destacado islâmico líbio Ali Sallabi também vivia, e o Taleban afegão pode abrir uma representação no país. Escolas e empresas americanas também possuem unidades e bases aqui.

A economia do Qatar tem o maior índice de crescimento do mundo, e o país tem a maior renda per capita mundial. Diplomatas dizem que centenas de milhões de dólares do país foram canalizadas para a oposição na Líbia.

Um canal de TV da oposição líbia foi montado em Doha. O Qatar despachou à Líbia assessores treinados no Ocidente que ajudaram a financiar, treinar e armar os rebeldes líbios contra Gaddafi.

Conservar canais abertos com uma gama de forças distintas é uma das bases da política qatariana. O país abriga duas bases americanas, com mais de 13 mil militares; no Líbano, o emir foi recebido no ano passado como herói por partidários do Hizbollah por ter ajudado a reconstruir cidades destruídas por Israel em 2006.

O Qatar tem vínculos estreitos com a Irmandade Muçulmana na Líbia, na Síria e no Egito, e com o islâmico tunisiano Rachid al Ghannouchi, todos os quais vão desempenhar papéis cruciais na política árabe.

Mas o país conta também com a influência da Al Jazeera, que o emir fundou e financia e que, cada vez mais, reflete a política externa qatariana.

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