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Para melhor ou pior, Trípoli muda

Por CLIFFORD KRAUSS

TRÍPOLI, Líbia - Esta não é mais a capital de um Estado policial. Mas ver o que Trípoli virou em tão pouco tempo pode ser aanimador e assustador.

Traficantes de haxixe oferecem seu produto abertamente na praça dos Mártires, no centro, conhecida como praça Verde até Muammar Gaddafi ser deposto. Motoristas furam os sinais vermelhos, e manifestações políticas atrapalham o trânsito.

Milícias irregulares, que em muitos bairros substituíram a detestada polícia, demonstram publicamente a indisciplina com suas armas, e fazem disparos acidentais ou para o alto.

Trípoli é uma cidade vibrante, com quase 2 milhões de habitantes e um porto movimentado, agraciada com ruínas romanas e muralhas de antigas fortificações deixadas pelos otomanos e outros conquistadores. Embora tenha passado por outras mudanças ao longo dos séculos, o que está acontecendo agora era inimaginável há apenas dois meses, quando Gaddafi controlava os mínimos detalhes do cotidiano.

Vidros fumês eram proibidos nos carros; agora, por todo lado motoristas colam plásticos verde-escuros nos parabrisas, para se protegerem do sol, mas também como sinal da sua recém-adquirida liberdade. Vendedores de frutas e verduras eram impedidos de trabalhar na maioria das ruas; agora, estão às pencas oferecendo bananas e laranjas sob viadutos e nas rotatórias, piorando os congestionamentos.

Na época de Gaddafi, o inglês era praticamente vetado em placas oficiais. Agora, inscrições nesse idioma brotam por todos os lados, apesar de poucos líbios entenderem o que elas dizem. Essas placas são mais uma expressão da libertação, e também da disposição do país em se abrir ao resto do mundo.

"Hoje, Trípoli tem um novo batimento cardíaco", diz, em inglês, um outdoor do governo municipal interino, mostrando dois milicianos abraçados. Até mesmo muitos dos onipresentes grafites revolucionários são em inglês. "Libya Free" é o mais comum. Alguns dizem "thank you, Nato", agradecendo a ajuda militar da Otan na derrubada de Gaddafi.

E, naturalmente, há numerosos rabiscos recentes retratando o ditador com roupas de palhaço, ou com uma cabeça caricatural sobre o corpo de um animal.

A maioria dos tripolitanos diz nunca ter sido tão feliz, mas ainda há inquietação. "As pessoas não entendem o que é a liberdade", disse a estudante de direito Sara Abulher.

"Elas acham que liberdade é fazer o que você bem entende, mas liberdade precisa significar que todo mundo também respeita as necessidades dos outros. Liberdade significa não ultrapassar o limite alheio."

O enfermeiro Otman Abdelkhalig disse: "Este é um novo país; as pessoas estão felizes porque agora podem finalmente falar livremente".

Mas ele vê um lado lamentável da liberdade. Os motoristas de Trípoli, que sempre foram conhecidos por sua agressividade, estão dirigindo mais perigosamente do que nunca. Pelo menos 15 vítimas de acidentes de tráfego aparecem diariamente no pronto-socorro em estado grave, segundo Abdelkhalig. E a cada dia duas pessoas são internadas com ferimentos a bala.

O governo provisório mal começou a formar um Exército nacional e a organizar as forças policiais. Trípoli já teve cerca de 4.000 policiais organizando o trânsito e lidando com infrações banais, mas muitos simplesmente abandonaram o emprego, e a antiga cúpula foi demitida.

Mas a falta de uma polícia normal não parece ter motivado uma onda de crimes que vá além de um aumento dos vícios. Algumas pessoas se queixam de mais furtos de automóveis, mas os moradores dizem não achar perigoso andar nas ruas, e os comerciantes não temem assaltos.

No entanto, outro tipo de atividade ilegal prolifera no precário bairro de Gergarg. Em frente às suas casas, as pessoas vendem abertamente haxixe e "bokha", um destilado à base de figos. "A Líbia está 100% diferente", afirmou um vendedor que se identificou como Ibrahim, enquanto exibia caixas com bebidas finas, vinhos e barrinhas de haxixe. "Tudo está bem. Estamos livres."

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