Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros

Dos esgotos de Varsóvia, uma história de heroísmo em meio ao Holocausto

Polonês desafiou os nazistas para fazer a coisa certa

Por LARRY ROHTER

Inicialmente a diretora polonesa Agnieszka Holland quis distância do roteiro de "In Darkness", drama recém-lançado nos cinemas sobre a história verídica de judeus na Polônia que escaparam dos nazistas, escondendo-se em esgotos.

Ela já tinha feito dois filmes sobre o Holocausto -"Colheita Amarga", de 1985, e "Filhos da Guerra", de 1990-, ambos indicados ao Oscar.

"Foi muito doloroso passar dois anos ou mais de minha vida nesse mundo, que sem dúvida alguma muda alguma coisa em nosso corpo e nossa alma", explicou a cineasta de 63 anos.

Mas David Shamoon, publicitário canadense que escreveu o roteiro e o levou a Holland, foi persistente. Ao ler sobre a história em um jornal, quase uma década atrás, o que o atraiu foi um detalhe improvável que ele pensou que também interessaria à diretora: os judeus foram escondidos debaixo das ruas de Lvov pelo polonês Leopold Socha, trabalhador nos esgotos, pequeno ladrão e ele próprio antissemita.

"O sujeito não era um herói, mas acabou por fazer a coisa certa, o que, para mim, é a verdadeira versão do heroísmo", disse Shamoon, 64 anos.

A relutância de Holland começou a derreter. "A história começou a me chamar", ela contou, "penetrou em mim e virou parte de mim, ao mesmo tempo em que eu ainda dizia 'não'".

Holland queria também fazer uma correção ao que descreveu como "vários filmes sobre o Holocausto que eu tinha visto nos últimos anos e que achei muito fake de alguma maneira, tanto artística quanto humana".

A diretora disse que não queria identificar os filmes, mas, falando em termos gerais, afirmou que quando se usa o inglês nesses filmes, por exemplo, "de alguma maneira se faz com que a história se torne convencional: não é real, estamos representando".

Dos sobreviventes que no verão de 1944 emergiram dos esgotos de Lvov, hoje situada na Ucrânia e chamada Lviv, apenas Krystyna Chiger, 76 anos, ainda está viva. Depois de migrar da Polônia para Israel em 1957, em 1968 ela se mudou para os Estados Unidos, onde praticou odontologia. Aposentada, ela vive em Nova York com seu marido, Marian, também sobrevivente dos guetos poloneses.

Chiger disse que sempre evitou assistir a filmes sobre o Holocausto, "porque é impactante para mim". Mas ficou curiosa para ver como sua própria experiência seria mostrada na tela.

Quando assistiu a "In Darkness" no Festival Internacional de Cinema de Toronto, em setembro, ela emergiu com a sensação de que Holland "foi tão realista que me senti de volta no esgoto, sentindo o cheiro do esgoto".

O relato que Chiger publicou em 2008 sobre sua experiência, "The Girl in the Green Sweater", acaba de ser lançado em polonês, assim como as memórias do pai dela sobre todo o período da Segunda Guerra Mundial. Seu livro virou um grande sucesso de vendas na Polônia.

"In Darkness", que estreou nos Estados Unidos em 8 de dezembro e sairá na Polônia e Alemanha em janeiro e fevereiro, é visto como forte candidato a figurar entre os indicados ao Oscar de melhor filme em língua estrangeira.

Mas restam algumas perguntas que simplesmente não podem ser respondidas, como concordam todos os envolvidos no filme. A mais fundamental delas talvez seja: Por que Socha arriscou sua própria vida -e a de sua mulher e filha- por pessoas que lhe eram estranhas totais?

"Esse é o mistério do coração humano", disse o ator polonês Robert Wieckiewicz, que representa Socha.

"Hoje temos a tendência a não oferecer ajuda quando alguém bate à nossa porta e pede uma moeda ou um prato de sopa.

Por isso fico fascinado com as pessoas que, em circunstâncias de guerra, com a morte rondando a cada instante, conhecem outro ser humano e dizem 'vou lhe dar uma mão'. É um mistério fantástico, algo que nunca vou ser capaz de desvendar."

Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.