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Inteligência - Nadia Al Sakkaf

O futuro das mulheres no Iêmen

Aumento no feminismo iemenita não é sustentável

Sanaa, Iemen

O velho se foi, ou é o que parece. Depois de 33 anos de governo no Iêmen, o presidente Ali Abdullah Saleh concordou em deixar o poder no mês passado. Esta é uma oportunidade para dar mais poder real às mulheres, não apenas um surto de adrenalina.

Dizem que Saleh era um dos governantes liberais da região do Golfo em relação às mulheres. O Iêmen tem duas ministras, uma embaixadora, duas mulheres no conselho consultivo, nove vice-ministras e dezenas de mulheres como chefes de departamentos do setor público. O Iêmen parece um país moderno, com tantas mulheres em posição de poder.

O novo governo de coalizão da oposição inclui duas ministras e uma ministra de Estado, uma melhora mínima sobre o que havia antes. No entanto, esses cargos são nomeados; em outros cargos que são eleitos a situação é pior. Só há uma mulher no Parlamento, ao lado de 300 homens.

Mas quando começou o levante no Iêmen, em fevereiro, houve uma mudança de atitude em relação ao papel das mulheres. De repente, era aceitável para uma mulher iemenita ser vista em público e na esfera política. As líderes mulheres não apenas eram reconhecidas como celebradas. Tawakkol Karman, que foi uma das primeiras pessoas a pedir a queda de Saleh e que rompeu o estereótipo sobre o potencial das mulheres iemenitas de se tornar líderes, ganhou o Prêmio Nobel da Paz. A porta-voz de oposição do Conselho, Hooria Mashour, foi indicada ministra dos Direitos Humanos no novo governo.

Mas, como em toda transição repentina, há um problema. O surto feminista das mulheres do Iêmen não é genuíno nem sustentável.

Há desconexão entre as líderes e o restante das iemenitas. Em pesquisas recentes feitas pelo "The Yemen Times", mais de 85% das mulheres responderam negativamente quando perguntadas se votariam em Karman para presidente. Disseram que ela não as representa porque não leva uma vida normal. Ela viaja, vive em uma tenda, faz manifestações e é agressiva para o gosto do eleitorado. As mulheres iemenitas comuns não se identificam com ela.

Isto é muito natural. Acontece quando ocorre uma revolução em vez de uma evolução. Quer dizer que a sociedade iemenita -incluindo as mulheres- ainda não está pronta para aceitar as mulheres na vida pública e como líderes.

Durante os protestos, houve relatos de mulheres queimando seus véus e lenços, em protesto contra a morte de manifestantes pacíficos na cidade de Taiz, no sul do país. A notícia foi tratada pela imprensa internacional como semelhante à "queima de sutiãs" feminista. Mas foi muito distante de uma expressão de empoderamento feminino.

Essas iemenitas não queimaram seus próprios véus; elas trouxeram véus avulsos para tanto. Isso não adianta, não é? Elas seguiam uma tradição tribal que manda uma mulher em dificuldades ser resgatada pelo xeque porque ela é "impotente".

O problema é que os iemenitas endossam e alimentam esse estereótipo feminino. Eu me lembro de discutir com um jovem iemenita que abandonou a faculdade, tentando encorajá-lo a concluir sua educação. Mas ele disse que, depois da morte de seu pai, precisava ser o homem da família porque é o mais velho dos irmãos. Ele não abandonou a escola porque tivesse de ganhar a vida; a família tinha dinheiro suficiente. Disse que tinha de fazer coisas para sua mãe, como ir à loja e levar os irmãos à escola. Quando lhe perguntei por que sua mãe não podia fazer essas coisas ela mesma, ele me olhou em choque e disse: "Você espera que eu deixe minha mãe, que é mulher, sair para fazer compras em um mercado cheio de homens estranhos?"

Esse rapaz ou esqueceu ou ignorava que estava falando comigo, outra mulher iemenita, que é ativa publicamente. Ele achava certo algumas mulheres participarem da sociedade, mas não sua mãe. Há milhões de homens iemenitas que pensam assim.

Embora hoje várias mulheres dirijam grupos de direitos humanos e de jovens, elas não têm um grupo de apoio. Para tornar a igualdade real, os líderes políticos precisam capitalizar o surto de empoderamento das mulheres e escrever novo capítulo no país.

As mulheres têm trabalhado para aplicar uma cota feminina de 15% em futuros cargos eleitos e não eleitos. Fala-se que o novo governo transitório formado em 7 de dezembro vai incluir uma cota. Mas, a menos que o empoderamento das mulheres seja uma prioridade política, ter quatro ministras em vez de duas não vai resolver a disparidade de gêneros.

Hoje as mulheres iemenitas formam apenas 20% da força de trabalho e trabalham principalmente em fazendas. Aumentar o número de mulheres no setor privado vai melhorar sua visibilidade na economia. Um estudo de 2009 do Comitê Nacional das Mulheres do Iêmen mostrou que os lares chefiados por mulheres gastam muito mais em educação do que aqueles chefiados por homens.

As iemenitas têm a vontade; elas precisam de apoio. Precisamos de mais que mulheres fortes. A atitude de toda a sociedade precisa mudar antes que possamos comemorar o empoderamento.

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