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Inteligência/Roger Cohen

Um tecido social mais inclusivo

Como uma rua em Londres promove a responsabilidade

Londres

A capital britânica está nas últimas fases de sua remodelação para os Jogos Olímpicos neste verão: um novo ônibus vermelho com uma plataforma traseira na qual se sobe e desce como no Routemaster original; no metrô, os trajetos no fim de semana viram um exercício de adivinhação. Mas talvez a obra mais significativa do ponto de vista social até agora seja a que foi feita em uma avenida que do Hyde Park até o Museu Victoria e Albert.

Ao custo de quase US$ 40 milhões, a Exhibition Road foi transformada na maior amostra do embelezamento de Londres. Um desenho em granito xadrez preto e branco se espalha por toda a largura da rua, dos dois lados de uma fileira de postes de iluminação altos e esguios que lembram refletores mais que postes tradicionais. Sair do parque para essa rua à noite é como entrar em uma terra de sonhos.

O que é especialmente onírico, quando você tenta se orientar, é que não há calçadas. Carros, ciclistas e pedestres se movem em uma superfície única, sem meio-fio. Só os canais de drenagem cobertos de grades de ferro preto e uma faixa de pavimentação áspera (para os cegos) separam a área de pedestres, de um lado, das áreas de veículos. Essa é uma nova forma de paisagem conhecida na linguagem do urbanismo como "espaço compartilhado".

A ideia do espaço compartilhado, criada por um engenheiro de trânsito holandês, Hans Monderman, vira de ponta-cabeça o pensamento tradicional sobre segurança viária. Na maior parte do século 20, acreditou-se que um fluxo de tráfego eficiente dependia da total separação entre veículos e pedestres, complementada por sinais de trânsito, placas, barreiras e sinalização viária que manteriam as pessoas seguras. O Estado se encarregou da regulamentação; o indivíduo (seja dirigindo ou a pé) só precisava obedecer às instruções.

Monderman, que morreu em 2008, tinha outras ideias. Ele queria aumentar a consciência e a responsabilidade coletivas eliminando todas essas placas e toda a divisão. E ele acreditava que a segurança de fato seria maior se todos os usuários fossem conscientes uns dos outros.

Às vezes, ele testava seus esquemas -desenvolvidos em várias cidades holandesas, como Oudehaske e Drachten, assim como em cidades alemãs e escandinavas- caminhando para trás no meio do tráfego intenso.

Suas teorias para um tecido social mais inclusivo se mostraram funcionais; a Exhibition Road é hoje o tributo mais destacado a suas ideias no Reino Unido. Ben Hamilton-Baillie, um urbanista baseado em Bristol que conheceu bem Monderman, me disse: "Se transferirmos a consciência do motorista para que ele seja uma parte do reino público, conseguiremos muito mais consciência. Também mudamos a percepção de tempo do motorista; ele é muito mais paciente do que em uma freeway de Los Angeles. Na origem, tudo isso tem a ver com promover a civilidade, para a qual não existe uma medida científica, ao se incluir um leque maior de pessoas em um espaço urbano. Os limites de velocidade sociais são mais eficazes que os regulatórios".

Hamilton-Baillie pensa que os limites de velocidade deveriam ser totalmente abolidos nas cidades, enquanto os espaços compartilhados seriam expandidos. Certamente é fascinante observar pessoas na Exhibition Road -motoristas, ciclistas, pedestres- negociando o espaço que se estende entre os prédios dos dois lados, criado para eles. A desorientação é seguida por um maravilhamento cauteloso.

Monderman pensou que o início do progresso no espaço urbano era uma sensação de insegurança. Daí fluía o reconhecimento do outro.

Precisamos mais dessa ideia de espaço urbano compartilhado. O Estado babá, armado de tecnologia, foi longe demais na regulamentação da vida. As pessoas, com seus dispositivos portáteis, foram longe demais em seu isolamento egoísta, perdendo a consciência do que acontece ao seu redor. É a morte da comunidade.

Tais problemas vão além do planejamento urbano, é claro. Mas quando os semáforos, meios-fios e placas são removidos a adaptabilidade humana é valorizada. A civilidade é necessária para que as coisas funcionem. As percepções mudam.

Eu gostaria que os projetistas da nova Exhibition Road tivessem confiado plenamente em sua ideia. Mas há algumas placas indicando o limite de velocidade de 30 km/h. E quando houver uma grande festa na rua durante a Olimpíada o tráfego será proibido durante nove dias. Uma ideia melhor era deixar os carros fazerem zigue-zague com a população dançando sobre suas capotas.

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