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ZHOU YOUGUANG

Dissidente chinês depois dos 85 anos

POR SHARON LAFRANIERE

PEQUIM - Zhou Youguang é o inventor do Pinyin, o sistema ortográfico romanizado que ligou a antiga escrita chinesa à modernidade, e ajudou a China a praticamente erradicar o analfabetismo.

Aos 106 anos, ele poderia ser promovido pelos líderes chineses como um modelo para a juventude, não fosse por um defeito: Zhou não apoia o regime unipartidário.

Ele é relativamente novato em polêmicas, pois só se envolveu com a política depois de se aposentar, aos 85 anos. Mas está tirando o atraso. "A democracia", afirmou ele, "é a forma natural de uma sociedade moderna". Ele rejeita o argumento de que a China não estaria preparada. "Você pode ter democracia em qualquer nível de desenvolvimento", disse ele. "Basta ver a Primavera Árabe."

Zhou trabalha numa escrivaninha fornecida pelo governo, no seu apartamento no terceiro andar, de um prédio sem elevador. Os posts no seu blog falam de modernização do confucionismo, da história da rota da seda e da nova classe média chinesa, por exemplo. Seu velho colega Chen Zhangtai, 80, disse que Zhou é a personificação de um "verdadeiro acadêmico". "Ele sempre parece em paz com o mundo."

Nascido em 13 de janeiro de 1906, quando a dinastia Qing reinava, Zhou é filho de um funcionário da corte e se casou com a herdeira de uma família rica. Em 1946, mudou-se com a família para Nova York, onde representou o Xinhua Trust and Savings Bank. Viajou pelos EUA em trens de luxo e foi à Europa no transatlântico Queen Elizabeth. Conversou longamente com o físico Albert Einstein em várias ocasiões.

Mas logo antes da vitória comunista, em 1949, Zhou voltou à China com a família. Em 1955, o então primeiro-ministro Zhou Enlai o convocou a Pequim. O partido queria transformar o mandarim em idioma nacional da China, simplificar os caracteres chineses e conceber um novo alfabeto fonético.

No ano seguinte, a campanha nacionalista de Mao Tse-tung voltou-se contra economistas formados no exterior. Um dos melhores amigos de Zhou, chefe de uma unidade de pesquisas econômicas, cometeu suicídio.

A Revolução Cultural (1966-76) esgotou a crença de Zhou no comunismo. Ele foi humilhado publicamente e enviado para dois anos de trabalhos forçados no interior. Ao voltar, foi readmitido no governo, lutando para que o Pinyin fosse adotado como padrão internacional. A ONU acatou isso em 1986.

Zhou diz que os caracteres chineses ainda existirão por muitos séculos. Mas, para sua alegria, o Pinyin se mostra cada vez mais útil. Os chineses agora empregam programas de transcrição em Pinyin para escrever mensagens de celular, posts de microblogs e e-mails. O próprio Zhou usa uma máquina de escrever que transforma o Pinyin em caracteres, com os quais tece críticas cada vez mais agudas ao partido.

Sobre Mao, ele disse numa entrevista: "Nego que ele tenha feito algo de bom". Sobre o massacre da praça Tiananmen, em 1989: "Tenho certeza de que um dia se fará justiça". Sobre o apoio popular ao Partido Comunista: "O povo não tem liberdade para se expressar, por isso não podemos saber".

Quanto a estimular a criatividade no sistema comunista, Zhou escreveu, em um livro de ensaios de 2010: "As invenções são flores que crescem do solo da liberdade. A inovação e a invenção não crescem das ordens do governo".

Assim que a primeira tiragem saiu, o livro foi proibido na China.

"Você pode ter democracia em qualquer nível de desenvolvimento. Basta ver a Primavera Árabe."

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