Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Análise

Para a Síria, não há saída fácil do conflito

Por ANNE BARNARD

BEIRUTE, Líbano - A Síria está presa a um impasse violento e sinistro. Disposto a matar e com grande superioridade militar, o presidente Bashar Assad poderia se manter no poder por meses ou anos, impedindo a oposição de controlar qualquer território e lhe negando espaço para desenvolver uma liderança eficaz, segundo analistas e sírios envolvidos na revolta.

Por outro lado, eles dizem que a força bruta, por si só, dificilmente será capaz de erradicar o que se tornou uma insurgência difusa e imprevisível, capaz de atacar mesmo depois de o governo ter usado uma força esmagadora contra centros da resistência como Homs, Idlib e Deraa.

Mas, com tanto sangue já derramado, a diplomacia paralisada e ambos os lados recusando-se a negociar, não há saída óbvia. Isso faz da Síria uma exceção entre os países varridos pelas revoltas árabes -impermeável a uma revolta popular prolongada, e até agora fora do alcance de uma intervenção externa. O conflito virou uma guerra de atrito, que se torna mais perigosa com o tempo.

Muitos sírios dizem que Assad não pode se dar ao luxo de parar de atirar e que talvez jamais volte a governar como antes, quando sua autoridade decorria de vínculos sectários, de interesses econômicos e do medo. Se ele reduzir a repressão, dizem sírios de muitos matizes políticos, os cidadãos vão exigir sua saída.

"Vamos ver milhões de manifestantes nas ruas, não centenas, e o regime sabe disso", disse um engenheiro cristão na cidade velha de Damasco (como muitas pessoas entrevistadas na Síria, ele não quis se identificar, por medo de represálias).

As soluções mais rápidas -a saída de Assad ou um golpe de dentro do regime- também parecem altamente improváveis, segundo analistas.

As autoridades de segurança que poderiam ser capazes de derrubá-lo agora consideram que seu destino está entrelaçado ao dele. A opinião pública já sofreu demais para se satisfazer só com um golpe, ela buscaria a queda do sistema inteiro e possivelmente também a vingança.

O uso da força tem gerado resultados imediatos, mas a um custo alto: implosão da economia e abalo à base de apoio de Assad.

Alguns membros de grupos com os quais Assad conta -as elites empresariais sunitas, a minoria cristã, funcionários públicos e jovens cosmopolitas ambiciosos- disseram recentemente que perderam a fé no governo e não acreditam mais no seu discurso de vitória.

Reem, funcionária pública da área da saúde que disse ter apoiado Assad durante muito tempo, mas que agora trabalha em um hospital de campanha cuidando de manifestantes feridos, resumiu as opções do presidente: "Matar todos os manifestantes sírios ou sair em paz para salvar o país", afirmou ela, enquanto sua mãe servia café na casa onde moram, num subúrbio de Damasco.

Alguns dos questionáveis vínculos empresariais do governo também parecem estar se desmanchando.

Em uma casa de câmbio no centro de Damasco, recentemente, clientes barganhavam dólares ansiosamente. O proprietário Anas, 25, disse que no começo de março os operadores do mercado negro, irritados com as prisões de alguns colegas, romperam um "acordo de cavalheiros" com o Estado para manter o valor informal do dólar relativamente perto da cotação oficial. Isso ajudou a elevar o preço da moeda americana dentro da Síria.

Cortes de energia deixam as casas frias e escuras e já levam à falta de pão até na capital. Recentemente, 60 carros faziam fila para comprar gasolina perto da histórica estação ferroviária de Hijaz, no centro de Damasco, numa imagem sem precedentes.

"Não sou anti-Assad, mas não posso apoiar o governo do presidente Bashar Assad, que não me oferece nada", disse o funcionário público Yusef, 40.

"O governo nos vende a propaganda tola das suas vitórias em Homs, Baba Amro ou Idlib", afirmou, citando redutos rebeldes recentemente atacados pelo governo, em ofensivas que se estenderam por semanas e incluiram cercos a cidades inteiras e bombardeios a áreas civis.

"Mas precisamos é de comida e energia elétrica, não de promessas sentimentais", acrescentou.

Yusef descreveu a crise econômica como "o ponto de inflexão para os moradores de classe média e pobres, que começaram a mudar suas opiniões políticas".

Colaboraram um funcionário do jornal "The New York Times" em Damasco e Hala Droubi, de Beirute

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.